quarta-feira, 31 de julho de 2013

Comentário: "Hitchcock" (2012)


Todo cinéfilo que admira a obra do cineasta inglês Alfred Hitchcock (1899-1980) sabe a grande parceira que o Mestre do Suspense teve em sua esposa Alma Reville (1899-1982). Graças a ela, uma das maiores obras-primas do gênero, “Psicose”, de 1960, por pouco não foi um tremendo fiasco que macularia a imagem do marido. É essa a história que Sacha Gervasi nos traz em “Hitchcock” (Hitchcock, 2012): a relação entre Alma e Alfred em um momento de crise criativa do cineasta – problema que se estende ao casamento que já durava três décadas.

No filme, logo após a festejada premiére de “Intriga internacional”, de 1959, Hitchcock (magnificamente “restaurado” fisicamente e pela interpretação impecável de sir Anthony Hopkins) é questionado por um repórter se, àquela altura, nos seus 60 anos de idade, não estaria na hora de “sair de cena”. Um pequeno salto de poucos anos nos traz o inglês em busca de uma nova história para levar às telas. É quando descobre o livro “Psicose”, de Robert Bloch, um relato sobre um assassino em série – escolha que faz a imprensa e os produtores torcerem o nariz.

Alma Reville (Helen Mirren, como sempre uma atriz de talento respeitável) também discorda do marido sobre sua decisão de transformar uma história muito violenta em filme. Nessas idas e vindas surge Whitfield Cook (Danny Huston), roteirista que tenta aproveitar o momento para aproveitar sua amizade com Alma e usá-la para “empurrar” um roteiro para Hitchcock.

O foco do filme, porém, não fica centrado nos bastidores de “Psicose”. Acima disso, está a relação estagnada entre Alfred e Alma – ele, obcecado pelas suas protagonistas lindas e louras como Grace Kelly e Kim Novak, guarda fotos delas em sua escrivaninha. A descoberta de Alma sobre essa paixão secreta – ela, já cansada dos flertes do marido com suas estrelas, como Janeth Leigh (Scarlett Johanson, perfeita), escolhida para ser a desafortunada protagonista de “Psicose” – acaba aproximando-a de Whitfield na ajuda em melhorar o seu roteiro. Alfred passa a questionar a fidelidade da esposa, gerando interferência até mesmo nas filmagens da futura obra-prima. 
 
O filme em si funciona até mesmo com uma homenagem a Hitchcock. O prólogo segue o estilo usado pelo cineasta na famosa série “Alfred Hitchcock apresenta”: uma situação que termina em crime, observada pelo inglês, que a partir dali narra – com seu sutil senso de humor negro - o que acontecerá em seguida. Os devaneios do personagem em seus diálogos imaginários com o assassino em série Ed Gein (Michael Wincott), inspirador de Bloch ilustram um pouco do processo criativo que resultou em um dos mais originais filmes da década de 1960 e um marco no cinema de suspense.

Mas a verdadeira heroína de “Psicose” acaba sendo, no final das contas, a própria Alma, que tomou para si a tarefa de reeditar a película para transformá-la, de fato, no espetáculo no qual se tornou. Foi o seu afeto ao marido, afinal, que imortalizou o atormentado Norman Bates na história da sétima arte. Emocionante, para dizer o mínimo!

Publicado no caderno Plateia, jornal Amazonas em Tempo, edição de 28/07/2013, sob o título "O amor por trás da obra-prima"

sexta-feira, 19 de julho de 2013

O trânsito e o homem da caverna




O personagem Pateta em transformação ao volante: desenho para reflexão

Por Jacqueline da Silva Souza e Breno Rosostolato*

O trânsito nas grandes metrópoles tem ficado cada vez mais insuportável. Coisas absurdas acontecem, mas principalmente falta de paciência, desespero, desrespeito e insanidade, que trazem atitudes violentas e cruéis, modificando o quadro de cidadania da população.

Se reportarmos à época das cavernas, vamos verificar todos esses itens, mas com uma diferença, hoje nos consideramos “civilizados”. Será? Basta uma fechada ou alguém nos xingar e aí, aparece quem? – O homem das cavernas interior – só nos falta o tacape.

Quem nunca ouviu uma história de alguém que foi alvo da ira de outro motorista por causa de uma simples buzina. Xingamentos, gestos obscenos, perseguições, fechadas... provocando pânico. Hoje, basta alguém dizer um impropério que leva “chumbo”. Sem contar que podem arrancar o seu braço, jogá-lo no rio e ficar por isso mesmo. Também se sabe que que é proibido ingerir bebidas alcoólicas e dirigir, porém quantos respeitam isso?

Há uma história bem interessante da Disney, um episódio do Pateta, que é um ser pacato, respeitável, bom cidadão, enquanto pedestre; no entanto, ao entrar em seu carro e colocar suas mãos sobre o volante, transforma-se num “monstrengo”, - um verdadeiro homem das cavernas -, não respeita os pedestres, nem sinal, buzina o tempo todo... Em suma, parece ter sido tomado por uma possessão. As autoescolas têm mostrado no primeiro dia de aula para aqueles que querem ser motoristas esse episódio. O que para muitos é engraçado, contudo, serve de reflexão.

Ultimamente, vemos esse tipo de coisa acontecendo. Na verdade, há sim uma transformação no ser humano, diria na maioria. Não obstante, verifica-se a mudança de personalidade de pessoas tranquilas, pacíficas, que ao entrarem em seus carros se descontrolam, decorrência a grande sensação de “poder”. A ideia de controle e de controlar é fascinante, muitos só têm essa sensação em seus automóveis. A pergunta é: há uma mudança de personalidade ou a demonstração da “real” personalidade de cada um?

Brigar no trânsito é coisa do homem das cavernas porque é um comportamento típico do troglodita, irracional e inconsequente, que na rua expressa toda a sua agressividade e revela sua alienação pessoal. Gritam e esbravejam como se fossem os donos da rua, passam a toda velocidade com seus carros milionários e denunciam a pobreza de seus condutores. O homem da caverna faz estardalhaço quando descobre o fogo, para que sua utilização leve à evolução, mas consegue distorcer as grandes descobertas em armas, aparelhos de destruição em massa. O carro que foi uma invenção com as melhores das intenções, para facilitar o dia a dia das pessoas, é renegado a um instrumento de status, genocídio e de insanidade. Insano mesmo são as mentes vazias, ou se preferirem, doentias, de indivíduos que têm verdadeiros comportamentos criminosos no trânsito e que assassinam muitas pessoas por ano nas ruas e estradas deste país.

O trânsito não é o responsável por esse tormento todo, e sim a falta de  princípios básicos como gentileza, educação e altruísmo. Sem os quais a barbárie vem à tona.

Se queremos um trânsito pacífico temos, à princípio, de nos pacificarmos enquanto cidadãos e pedestres.

* Jacqueline da Silva Souza e Breno Rosostolato são professores da Faculdade Santa Marcelina – FASM

quarta-feira, 17 de julho de 2013

E o Instagram "facebookizou" pra valer

Por Marcos Hiller*

Nos primeiros dias de vida, o Instagram era apenas quatro funcionários, incluindo seus dois cofundadores, e que trabalhavam amontoados nos primeiros escritórios do Twitter no bairro de South Park de San Francisco. E o Instagram, mais uma start-up da Califórnia e que não tem receita, fez brilhar os olhos de Mark Zuckerberg, que desembolsou um bilhão de dólares no ano passado e está debruçado em saber como capitalizar em cima dessa fascinante rede social de fotos - assim como o Google, há alguns anos, comprou o YouTube e o transformou no segundo maior site de buscas do mundo. Por trás da aquisição do Instagram percebe-se uma visível intenção do Facebook em se tornar ainda mais forte nos dispositivos móveis e deixar promissores aplicativos longe das garras do Google.

O Instagram é uma criação concebida puramente para o universo mobile. Quem o usa entende o magnetismo que essa rede social gera. O conceito é simples e genial ao mesmo tempo, pois faz com que pessoas se comuniquem por meio de imagens. A psicologia cognitiva talvez nos ajude a entender o fascínio por essa rede social, pois ela prega que seres humanos gostam mais de imagens do que de textos. Por esse motivo que praticamente todas as marcas do mundo sempre adotam um símbolo ou um mascote para acentuar sua aproximação aos consumidores. O conceito é simples: o Instagram é fundamentalmente uma rede social concebida em torno da fotografia e disponibilizado apenas para uso em celulares (apenas para iPhone da Apple, e agora já disponível também para o “patinho nada feio” Android, o sistema operacional da Google), onde as pessoas adicionam belíssimos efeitos em suas fotos produzidas com a câmera do celular e compartilham com os amigos. O Instagram já tem dezenas de concorrentes, mas nenhum outro aplicativo teve uma ascensão tão rápida.

No entanto, o que alguns fãs do Instagram mais temiam aconteceu. Semanas atrás, ao inserir a possibilidade de se postar vídeos de 15 segundos, o Instagram começa a perder a sua originalidade e suas peculiaridades. Assim como falavam que o Facebook “orkutizou” depois que classes mais emergentes descobriram o site azul de rede social, evidenciamos que o Instagram inicia lentamente um processo de “Facebookização”.

Novas características são incorporadas a cada mês. Essa última mudança então foi muito significativa. Você está lá descendo com o dedo polegar a sua timeline do Instagram e olhando suas fotos, comentando, curtindo e, de repente, um vídeo começa a ser executado. Eu achei esquisito e até me assustei algumas vezes. Parecia que as fotos ganharam vida. Muito em breve podemos esperar games no Instagram? Ou a possibilidade de se cutucar o outro? Só o tempo nos dirá. Mas nada disso me surpreenderia. O que se espera é um processo de "moneitização" do aplicativo. Afinal, hoje ele não gera receita. E assim como fez no Facebook no ano passado, começando a cobrar para que posts ganhem alcance maior (hoje mais de 1 milhão de clientes injetam dinheiro no site de Mark Zuckerberg), é muito previsível que esse movimento neoliberal aconteça também no nosso saudoso Instagram. Aproveite enquanto ele (ainda) é grátis!

* Marcos Hiller é coordenador do MBA Marketing, Consumo e Mídia Online da Trevisan Escola de Negócios e autor do livro Branding: A Arte de Construir Marcas, da Trevisan Editora.

Comentário: "Homem de aço" (Man of steel, 2013)




Por William Gaspar*

Esperança. O símbolo kryptoniano no peito do Superman sempre definiu bem o que a maioria dos fãs sentem em relação às produções relacionadas ao herói. Fazer comparativos aos dois primeiros filmes do “escoteiro” é no mínimo justo e tentar esquecer seu “retorno” é uma tarefa que levaremos para a vida, mas não vou fazer comparações e sim definir a nova trajetória do “Homem de Aço”.

Bom, vamos começar do começo. Chamado para dirigir, Zack Snyder tenta desesperadamente não ser ele mesmo, emulando outros cineastas com seu filme. Comparar os flashbacks em Smallville com o trabalho feito no filme “A Árvore da Vida” é obrigatório, com o alienígena crescido na terra contemplando a beleza da vida e explorando os EUA. São nessas cenas que o público consegue se relacionar com Clark Kent (Henry Cavill), vê-lo não como um alienígena, mas como alguém com sentimentos tão comuns quanto os seus.

Logo a seguir, o Homem de Aço pega alguns brinquedinhos emprestados da super caixa do J.J. Abrams, enchendo a tela com efeitos e brilhos que ofuscariam até a minha querida Enterprise. Isso tudo combinado a um resquício do estilo do próprio Snyder, que filma lutas como ninguém, com seus takes mais longos e físicos, privilegiando o impacto. Aqui, não só Kal-El parte pra porrada, como até seu pai, Joe-El (Russel Crowe, ótimo), abandona a fachada de cientista calmo e nerd para revelar-se um sujeito cheio de recursos e capaz de tudo para defender a família e o planeta. O mix fica completo com aquele visual dessaturado, meio bruto e sisudo, que Nolan tornou tão popular em O Cavaleiro das Trevas.

Explicando a história em fragmentos, com boas elipses (o corte que acontece depois da queda da nave no Kansas é surpreendente) e flashbacks emotivos, O Homem de Aço não é um filme de heróis típico. Entre as cenas emotivas, permite-se explosões e ação no melhor estilo Os Vingadores (um dos capangas do General Zod é o Hulk perfeito) com direito a momentos que lembram a devastação maluca dos Transformers e as lutas do Dragon Ball Z, com deuses se engalfinhando e cidades caindo.


Entre esses momentos épicos e tops, há um filme menor ali, sobre um homem em busca de sua própria identidade, alguém em uma jornada de autoconhecimento que o levará a diversos cantos dos EUA, tendo como bagagem apenas os valores dos pais. O roteiro de Nolan e David S. Goyer é bastante claro na maneira como vê o Superman. Como nas análises clássicas, aqui ele é o messias, o enviado à Terra para nos guiar, incompreendido e temido por nós. Há pelo menos três passagens que não deixam margem a dúvidas: Superman é Jesus Cristo em "O Homem de Aço" (o vitral da igreja, a menção à idade e a partida cruciforme da nave de Zod) e as implicações religiosas desse fato, ainda que pouco exploradas (já que ia encher o saco se explorassem mais), interessam os realizadores. É aí que entra o realismo de Nolan: no interesse pelas implicações filosóficas, sociais e religiosas da descoberta de que não estamos sozinhos no universo (mas isso é papo de nerd. Vamos esquecer).

Seguindo... Com sua atuação, Henry Cavill não deixa espaço para qualquer, eu repito, qualquer comparação que poderia existir com Christopher Reeve. Ele é seu próprio Superman, Clark Kent e Kal-El. Interpreta com emoção e com a ferocidade que determinadas sequências requerem. No meio de tudo isso, arranca suspiros de parte do público aparecendo sem camisa em diversas ocasiões.

Igualmente incrível (e maluco) está Michael Shannon, mais surtado do que nunca. Seu General Zod é obcecado e irredutível, mas tem suas razões para tal, já que é um escravo de seu próprio papel, a representação alienígena da ordem e da proteção. A ele nunca foi dada nenhuma opção de escolha pela sociedade kryptoniana - e isso o torna um vilão dos melhores que já vi em qualquer filme baseado em quadrinhos.

O elenco secundário (lê-se: que ganha menos) é igualmente determinante no sucesso do filme, para situar o herói entre dois mundos. De um lado, Kevin Costner e Diane Lane. Do outro, Russel Crowe e a mulher que interpreta Lara (sabe Deus o nome da atriz), cada um representando um conjunto moral que Superman necessitará para definir seu lugar.

Ah não posso esquecer a gatinha da Amy Adams, que interpreta a icônica jornalista investigativa Lois Lane. Ainda que a personagem esteja perfeitamente alinhada com a criação das HQs, a necessidade de colocá-la no centro da ação é um dos pontos fracos do filme. Provavelmente inseguros se o público se relacionaria efetivamente com Clark, deram a Lois a função de ser a âncora da humanidade no filme. O problema é que isso gera alguns momentos incompreensíveis (como o convite para subir a bordo da nave de Zod. Não sei o que ela tinha que fazer lá).

Um dos momentos mais controversos do filme é a batalha final entre Superman e o General Zod. A decisão de mostrar o super-herói - até hoje um dos grandes símbolos do altruísmo, benevolência e a incapacidade de matar - assassinando seu oponente (Lordes da justiça?).

Com certeza vai ter gente criticando e falando bobagem, mas cá entre nós, heróis assim não fazem mais o estilo dos fãs. Os tempos são outros e como o próprio diretor disse uma vez, a inocência terminou.

Vale lembrar, porém, que não é a primeira vez que Superman mata em uma história. O próprio General Zod e dois capangas figurantes de outra a dimensão foram mortos pelo herói usando kryptonita em Superman #22.

O monstro Apocalipse também foi morto pelo Superman - mas voltou à vida depois - na série A Morte do Superman. Mais recentemente, a versão "Novos 52" do kryptoniano matou parademônios, que foram estabelecidos como criaturas inteligentes.

Nesse mesmo universo, ele desferiu um golpe fatal em uma humana possuída (Superman #3) para impedi-la de destruir Metrópolis - no processo, apenas a entidade que a manipulava morreu, mas Superman não sabia que isso aconteceria. Outras criaturas e personagens foram mortos pelo Homem de Aço em sua loooooga história, mas a grande maioria em arcos ambientados em realidades paralelas ou outras mídias. No game Injustice, por exemplo, o Kal-El do futuro faz inúmeras vítimas. O Superman assassino, portanto, não é uma exclusividade de O Homem de Aço.

Por fim, o espetáculo visual que é "O Homem de Aço" escapa imune e diverte, com um desfecho que marca quem é este novo e sisudo Superman, que chega adaptado ao momento, carregando os valores pelos quais é conhecido, mas alguém que é capaz de reagir e tomar o controle da situação. Ainda que seu "S" represente a esperança, um Homem de Aço para os novos tempos.

* Jornalista

domingo, 14 de julho de 2013

Comentário: "Carrie, a estranha" (Carrie, 1976)

Uma brincadeira que termina em um verdadeiro banho de sangue em "Carrie"

Em uma época em que a criatividade anda em baixa e a indústria cinematográfica investe pesado nos remakes, os fãs do escritor Stephen King aguardam a nova versão de “Carrie, a estranha”, primeiro livro do rei da literatura de horror norte-americana e também o pioneiro em suas adaptações para as telas. Enquanto o filme dirigido por Kimberly Peirce não estreia por aqui – a previsão é final de novembro deste ano -, vale a pena revisitar a primeira adaptação dirigida por Brian De Palma em 1976 (dois anos após o lançamento do livro).

Carrie White, interpretada por Sissy Spaceck (então com quase 30 anos, mas perfeita como uma adolescente de 14), é uma estudante que sofre bullying em sua escola e é dominada pela mãe, a fanática religiosa Margareth White (Piper Laurie). Solitária e introvertida, a garota descobre ser telecinética – capaz de mover objetos com a força da mente. E isso ocorre de uma forma brutal: quando ela tem sua primeira menstruação, durante o banho na escola após a aula de educação física. Desconhecendo a origem do sangue – uma ignorância forçada pela mãe, para quem tudo relacionado à sexualidade era pecaminoso -, a jovem pensa estar morrendo e é ridicularizada pelas colegas, que lhe atiram absorventes higiênicos e gritam obscenidades. Em meio a essa situação, uma lâmpada explode: é o primeiro sinal de poderes que se externam após um grande trauma.

O episódio do banheiro aproxima Carrie da professora de educação física, senhorita Collins (Betty Buckley), que se compadece da ignorância da garota, lhe faz ganhar a simpatia da colega Sue Snell (Amy Irving) e a inimizade da estudante Chris Hargensen (Nancy Allen), que recebe, juntamente com as outras alunas agressoras, uma punição pela brincadeira de mau gosto. A chegada da menstruação de Carrie será, para Margareth White, a confirmação do que ela chama de “maldição do sangue”. Mas caberá a Chris Hargensen, com cumplicidade do namorado Billy Nolan (John Travolta), o papel de mentora da humilhação para Carrie no baile de formatura da escola, quando os poderes da garota serão usados em uma vingança sangrenta.

Carrie em duas versões: Sissy Spaceck e Chlöe Moretz
 Os méritos do filme de De Palma nunca foram superados. Dono de um apuro técnico em seus filmes, ele criou sequências antológicas na versão de 1976, não repetidas nem na versão para a televisão, de 2002 (exibida eventualmente pelo SBT), ou na continuação de 1999, “A maldição de Carrie” (The rage: Carrie 2). O desenrolar de cenas tensas em câmera lenta, as diversas simbologias que aparecem ao longo do filme (como a cruz branca no asfalto em frente à casa de Carrie) e, sobretudo, o uso do split screen (tela dividida) na sequência do baile dificilmente terão páreo. Mesmo com Chloë Grace Moretz no papel-título e Julianne Moore como Margareth White, a nova versão só deve primar – se seguir a tendência de outros remakes – pelos efeitos especiais mais realistas, sobretudo porque, como os trailers divulgados já revelaram, o novo filme será mais fiel ao livro que a versão de De Palma. Na película original, a destruição se limita ao ginásio da escola. Na obra de King, assim como na versão de 2002 (que manteve a narrativa fragmentada do livro) e na de Peirce, a fúria de Carrie também se abate sobre a cidade de Chamberlain, onde se passa a história. Vem chumbo grosso por aí. Ou não.

(Publicado no caderno Plateia, jornal Amazonas em Tempo, junho/2013)

quinta-feira, 11 de julho de 2013

Um olhar sobre Parintins

Pela quinta vez fui a Parintins durante o festival folclórico – a terceira a trabalho, depois de um intervalo de dez anos. Em 2008 e 2010, fui a passeio. No último ano, já comecei a ter outro olhar a situação do evento, considerada a maior da região Norte – e não gostei muito do que vi. A festa no bumbódromo é uma coisa. Fora, é uma repetição do que há em Manaus, com forró, brega e funk de mau gosto – aliás, posso dizer, com risco de ser mal interpretado, que a maioria dos visitantes da capital amazonense empestam a cidade, juntamente com a maior parte dos turistas de outros lugares. Quem conhece o festival e Parintins antes, durante e depois do evento, sabe muito bem que estou correto.

Atenhamos-nos, porém, ao festival deste ano (a esculhambação na cidade já foi tratada em outro post meu em julho de 2010), o 48º da ilha tupinambarana, palco do centenário – ainda que questionado – de Caprichoso e Garantido. Uma nova empresa organizou tudo, a Tucunaré Turismo – rebatizada, nos corredores, para Candiru Turismo, tamanho o incômodo causado aos que foram trabalhar na festa. As críticas pularam de todos os lados. E para não parecer injusto, cabe esclarecer que os dois bumbás tiveram papel neste que, sem dúvida, deve ter sido o pior festival de todos os tempos – profissionalmente falando.

Comecemos pela transmissão. Até hoje, praticamente duas semanas após o fim do festival, não consigo entender como foram fechados contratos com emissoras diferentes – uma para cada bumbá. O resultado disso pode ser testemunhado nos comentários das redes sociais por quem conseguiu ver um, mas não conseguiu o outro boi. A hipótese para tal decisão estranha: briga de diretorias, cada uma querendo ser melhor que a outra, para mostrar o seu bumbá como o melhor em tudo – como se isso dependesse da emissora escolhida. Cadê a unidade do festival? Nesse momento, o festival folclórico de Parintins deixou de existir para se tornar o festival folclórico do Caprichoso e o festival folclórico do Garantido. E a ilha que se dane, é só um palco mesmo... Lógica de Zé Mané.

Temos agora um bumbódromo ampliado, com iluminação nova, som novo, espaço para cadeirantes e transmissão em tempo real para portadores de deficiências auditivas. Mais de R$ 40 milhões – corrijam-me se eu estiver esquecendo algo na cifra, por favor – para haver mais espaço para quem possa pagar. Claro, porque o povão mesmo se espreme nas arquibancadas para torcer pelo seu bumbá. Pelo lado de fora, parece monumental. Fora do festival, a estrutura será utilizada para atividades educativas, o que foi devidamente divulgado pelo governo do Estado. Torço, sinceramente, pelo sucesso dessa empreitada. Chega de interior abandonado!

Quem trabalhou na cobertura do festival ficou espantado, mas não com a grandiosidade, e sim com detalhes não levados em conta e que causaram um tremendo incômodo. Os corredores sob as arquibancadas, onde ficaram concentradas as redações da mídia e a organização (segurança, engenharia e outros), viraram labirintos de vigas que poderiam arrebentar a testa dos mais distraídos. Pela falta de um sistema decente de escoamento, esses mesmos corredores viraram piscinas. Água nos banheiros também, pelo menos durante o dia, foi um item ausente. Em frente à sala destinada ao jornal Amazonas em Tempo, o piso teve que ser quebrado para arrumar alguma coisa (até hoje não sei o que diabos era aquilo).

As novidades que poderiam fazer a diferença no bumbódromo foram um tremendo fiasco. O espaço dos cadeirantes ficou um nível um pouco acima do fosso da imprensa, de frente para a arena, onde fotógrafos se espremiam para tentar capturar a melhor imagem – sim, porque o acessofoi restrito; ninguém mais poderia passear livremente pelos camarotes ou pela arquibancada para tentar fazer imagens diferentes, mais marcantes. Ainda com a parafernália de equipamentos colocados em frente, aos cadeirantes foi difícil assistir as apresentações. Arrisco dizer frustrante, até. Involuntariamente, os fotógrafos “cortaram o barato” dessas pessoas. E ainda havia outros desfilando por lá, parando justamente naquele ponto e atrapalhando mais ainda a visão. Sugestão? Vamos respeitar essas pessoas, tornando o setor mais alto, com rampas, para que elas também tenham direito à diversão.

Aí chegamos aos surdos-mudos. Bacana a iniciativa do telão, com uma intérprete de libras “traduzindo” (perdoem-me se não é o termo adequado) as letras das toadas. Só que um único telão, que logo era encoberto pelas gigantescas alegorias dos bumbás, se revelou uma tremenda trapalhada, para não dizer uma gigantesca inutilidade. Que tal instalar outros painéis, mais altos, em vários pontos do bumbódromo? Os R$ 40 milhões não foram suficientes?

Chegamos a nós, da imprensa. A Candiru, ops, Tucunaré Turismo, restringiu muito o acesso dos profissionais para a cobertura. Até compreensível, para evitar a entrada de pessoas que queriam ver o festival de pertinho sem pagar ou ir para a arquibancada das galeras. Mas a papagaiada começou no credenciamento: nos jornais impressos, só foram permitidos dois repórteres e dois fotógrafos, enquanto que o número de colunistas sociais era quatro. Convenhamos: quatro profissionais que se matam de trabalhar para fazer uma boa cobertura e outros quatro que só passam pelos camarotes para puxar o saco e massagear o ego de “celebridades” e dondocas. Onde está a lógica disso? Valorizar o fútil em vez do profissional? V.S.F.!

Antes dos aborrecimentos no fosso – espaço que ainda foi disputado por um e outro profissional de “imprença” que saracoteava mais que o povo da galera -, os primeiros dias antes do festival já indicavam o terror: nossa equipe precisou alugar mesas e cadeiras, porque os “bunitos” da organização não providenciaram tudo, conforme já havia sido acordado em Manaus uma ou duas semanas antes da nossa viagem (apenas para situá-los, chegamos a Parintins dia 21 de junho). Sem entrar em muitos detalhes para não parecer muito rodeio, fomos praticamente relegados a segundo plano. Até para acessar o bumbódromo por um caminho mais rápido houve “burrocracia”, porque o portão mais próximo se tornou exclusividade de acesso para os colegas de uma das emissoras que iria transmitir o festival. Isso não engoli até hoje, tamanha minha indignação.

Com essa esculhambação toda, demos o famoso “jeitinho brasileiro”. Um dos colegas que não foi credenciado a tempo usou a credencial de outro que não foi ao festival, para poder acessar o infame fosso. A fotógrafa de nossa equipe só conseguiu imagens gerais da festa porque tinha uma credencial do camarote da Coca-Cola – e ainda assim foi barrada em vários lugares (como se nos importasse registrar atores da rede Globo enchendo a cara e vendo o festival – duvido, sinceramente, que tenham pago por tudo isso). O outro fotógrafo teve que se acotovelar no fosso com os outros. Os repórteres tiveram que escolher um lado do bumbódromo para ficar, porque transitar entre os dois pontos era uma missão quase impossível. E assim conseguimos trabalhar, até mesmo superando o desânimo com tanta falta de respeito e planejamento decente.

O festival de Parintins está se tornando um produto exclusivo para televisão. A mídia impressa não tem mais o respeito adequado. Não reclamo tratamento VIP, isso pouco me interessa. Deixo isso para aqueles que fazem questão disso, de serem paparicados, quase carregados no colo – e sem merecer, diga-se de passagem. Eu me queixo da falta de estrutura ideal para fazermos nosso trabalho. Se ficar naquele fosso, sem acesso a nenhum outro lugar, é cobrir o festival, melhor parar aqui.

Enquanto os bumbás brigam para serem donos do festival, Parintins vira uma baderna. Ao que parece – e isso meus colegas que moram lá podem confirmar ou desmentir -, organização ali só acontece nessa época para maquiar a cidade para turistas. Não vi placas de sinalização até o dia da festa dos visitantes. Há poucos sinais de trânsito – e para uma cidade com mais de 100 mil habitantes, isso é uma deficiência gravíssima. Tudo o que tratei no post de julho de 2010 eu poderia repetir aqui – a falta de respeito com a população da ilha, principalmente. Dá para se ter uma ideia da arrogância dos bumbás pelo comportamento de um item feminino, que durante entrevista com nosso repórter, visivelmente mal humorada, respondeu evasivamente suas perguntas sem tirar o olhar - e os dedos - de seu celular. Para sorte do bumbá, foi o último ano da “estrelinha”.

Se toda essa esculhambação não tiver fim, podem ter certeza de que o sucesso do festival folclórico de Parintins está com os dias contados. Vai voltar a ser aquela disputa em cima de um tablado, porque ninguém aguenta desaforo e desorganização por muito tempo, haja o dinheiro que houver por trás. Aliás, até hoje não sei quem lucra com esse festival, pois a cidade continua com infraestrutura precária e a maior parte da população vive na informalidade – dado confirmado por uma pesquisa dos estudantes de Comunicação Social da Universidade do Estado do Amazonas (UEA) em Parintins, repassado por um colega.

Uma cidade com um evento desse porte há muito tempo deveria ter deixado de ser sazonal. Os dirigentes dos bumbás vivem bem, claro, mas não se ouve falar das famílias dos criadores de Caprichoso e Garantido. Muita gente sai lucrando nessa época, fora os patrocinadores. Algo de muito errado está por trás desse festival. Será que Parintins vai disputar com Manaus o título de Sucupira do mundo real? Lá, boi já voa. Tirem suas conclusões.

Para não dizerem que só reclamo, tenho que fazer elogios. Quanto à organização, a segurança foi muito eficiente – e isso foi bom porque todo mundo sabe que a rapiocagem de Manaus pega o barco para tocar o terror em Parintins (não é mentira!). Tenho que parabenizar, como sempre, os torcedores das galeras de Caprichoso e Garantido, que ainda guardam a essência do festival com sua garra. Vendo-os, é possível se emocionar e esquecer a canalhice que enfrentamos. Quanto à cobertura, todos os jornalistas que lá estiveram e passaram pelo mesmo sufoco restrições merecem todos os elogios. Em Parintins, agora, não basta ser profissional (ainda que o conceito para a organização, aparentemente, seja registrar caras e bocas). É preciso ter sangue de barata para acabar se tornando um herói da informação.

VIAGEM: Cabaceiras, PB (06/04/2024)

Pela terceira vez viajei à Paraíba nas férias - e a primeira vez com meu marido Érico -, e essa foi a oportunidade de realizar um sonho, alé...