Da região sul do Brasil, faltava-me conhecer, das capitais, Curitiba, sonho adiado de 2019 para este ano. Meu planejamento original, feito uns oito meses antes, incluía cinco dias em Curitiba, três em Foz do Iguaçu e os oito restantes em Florianópolis, cidade que adoro, sendo a quarta vez que a visitaria.
Aí veio a covid-19... Ainda havia poucos casos, pouca informação e muitas medidas de precaução. As máscaras ainda eram usadas apenas por quem estivesse resfriado ou com acessos de tosse, mas o álcool em gel e o distanciamento de aglomerações era a maior recomendação. Então como lidar com isso em meio a essa viagem originalmente programada de 13 a 29 de março?
Chegando em Curitiba do meio dia de 13 de março, um sábado, acompanhado de minha colega de trabalho Litamar Nascimento, que estava de mudança para Itajaí (SC) enquanto aguardava seu processo de aposentadoria, encontrei nossa outra amiga Katy Nicolet, que casara e morava na capital paranaense há alguns anos. Reencontro, papo em dia, almoço juntos e... vamos para o hotel descansar (a viagem em Manaus começara quase às 5h e fizemos conexão de uma hora em Brasília, e no último trecho passamos por uma situação bem incômoda e engraçada com a nossa companheira de fileira, mas o que acontece na aeronave, fica na aeronave!).
Nosso primeiro dia na verdade começou no final da tarde com um passeio nas proximidades. Como ficamos hospedados no Centro, estávamos perto do Shopping Curitiba, e fomos até lá para comer algo e conhecer um pouco a área.
No domingo, já bastante restabelecidos do cansaço da viagem, fizemos nosso primeiro passeio: o famoso roteiro de trem para Morretes. A empresa responsável nos apanhou com uma van no hotel pontualmente às 7h. A estação rodoferroviária de saída estava apinhada, e como precaução ficamos do lado de fora aguardando a chamada para o embarque. Com inimigo invisível e ainda pouco conhecido no país não se podia brincar.
A viagem até Morretes durou umas quatro horas, e foi um espetáculo! Pequenas cachoeiras, pontes, um panorama de tirar o fôlego! Como tenho um certo temor de alturas (apesar de adorar viajar de avião - vai se entender isso!), não me aproximei das janelas do trem e não registrei muitas dessas imagens. Na cidade de Morretes, onde almoçamos o famoso barreado (do qual gostei, mas achei o sabor muito parecido com conserva em lata...) e fomos conhecer a região que reúne restaurantes, lojas de souvenir, barracas de produtos diversos (ah, as balas de gengibre deliciosas!) e artes na praça (como um casal que deu um show de dança ao som de um flautista).
Morretes é uma gracinha de cidade! Achei tudo lindo e agradável, apesar do forte calor naquele domingo. O clima ainda não era de apreensão total, havia aglomerações, claro, mas eu e Litamar nos mantivemos sempre distantes o máximo possível. No almoço, acabei comendo mais rápido que as demais pessoas na mesa, para sair dali o mais rápido possível, pois o restaurante estava bastante cheio.
Terminado o passeio em Morretes, seguimos de van para o Hisgeopar, inaugurado há dois anos. Trata-se de um espaço destinado à divulgação da história e geografia do Paraná, e seu atrativo é uma enorme maquete animada sobre isopor concretado que conta a história do Estado desde a descoberta até os dias atuais. É um trabalho lindo e perfeito! Um guia explica ao grupo cada parte da maquete, nos levando a uma viagem no tempo! O valor do ingresso por pessoa é R$ 25 (março/2020).
O destino seguinte foi Antonina. Foi um city tour rápido, sem saída do veículo, com ponto final da loja de doces Bananina. Lógico que fiz a festa comprando sacos de bombons de banana de todo tipo: com pimenta, com gengibre, com coco... Depois das compras, seguimos de volta para Curitiba, onde jantamos no Shopping Curitiba e voltamos ao hotel para descansarmos. Aí então a vida noturna da cidade, pelo menos naquela região do Centro, estava capenga devido aos avanços do coronavírus. Mais um motivo para não sair à noite.
Na segunda-feira, dia 15, fomos ao Museu do Holocausto, cuja visita havia sido agendada gratuitamente por mim um mês antes pelo site. É uma visita necessária, mesmo com o impacto que isso pode causar. Dentro do museu há objetos pertencentes às vítimas do genocídio nazista durante a Segunda Guerra Mundial (malas, roupas e bens pessoais), fotos ampliadas de momentos tristes das etapas do extermínio, depoimentos gravados de sobreviventes e, no final, um tipo de altar onde colocamos, cada um, uma pedra em memória dos que foram assassinados. Não é permitido ao visitante tirar fotos dentro do museu, e a entrada passa por um rigoroso controle (objetos metálicos e bolsas devem ficar guardados num armário com chaves individuais).
Uma das fotos que mais me deixaram chocados foi do fuzilamento de um grupo de mulheres e crianças judias do gueto de Mizocz, na Ucrânia, em 1941. Já conhecia a imagem de livros sobre o Holocausto de minha pequena biblioteca, mas essa ampliação mostrou detalhes que não percebi, como duas crianças pequenas chorando entre os cadáveres fotografadas momentos antes de serem mortas a tiros. É uma experiência dolorosa, mas, repito, necessária.
Para relaxar um pouco, fomos caminhando para o Bosque do Papa, a uns 15 a 20 minutos de caminhada do museu. O parque estava aberto, mas as casas com atrações da cultura polonesa estavam fechados para manutenção naquele dia. É um lugar muito bonito, com trilhas diversas. Pouquíssimas pessoas estavam no lugar, reflexo das primeiras preocupações com o coronavírus.
Próximo destino: Jardim Botânico de Curitiba. O lugar me encantou demais. Tudo bem cuidado, um prato cheio para quem gosta de tirar fotografias. Ficamos bastante tempo por lá, até arranjamos um lugar no gramado para deitarmos um pouco e aproveitar tanta tranquilidade! Mas não trouxe nada de souvenir dali. Achei os preços exorbitantes para a baixa estação. Dali seguimos de volta para o hotel, antes passando no shopping para jantarmos.
No dia seguinte foi a vez de fazermos o famoso city tour no ônibus da linha Turismo! Compramos o bilhete único de R$ 50 na praça Tiradentes no momento de embarcarmos. Para nossa sorte, havia poucas pessoas, portanto a preocupação com aglomeração morreu. Um detalhe importante: o bilhete normalmente dá direito a parada em quatro pontos turísticos da cidade, mas na época liberaram e se quiséssemos poderíamos descer em todas elas - são 24 ao todo. Resolvemos parar nos mais interessantes, fora os que já havíamos conhecido no dia anterior: Museu Oscar Niemeyer (estava fechado para visitação como medida preventiva, mas pudemos acessar o salão externo), Bosque Alemão e Santa Felicidade. Deixei a Ópera de Arame de fora dessa vez porque achei os arredores sinistros por estarem muito vazios, e a Torre Panorâmica estava fechada também como medida de prevenção, assim como o Museu Ferroviário.
Nossa descida foi em Santa Felicidade, que reúne o melhor da gastronomia italiana naquela região. Depois de um almoço delicioso com buffet livre a R$ 28,90 por pessoa no Ristorante Siciliano, enquanto Litamar foi procurar um hotel para descansar antes de voltarmos para o Centro, fui bater perna pelo local, encontrando uma loja aberta da Florybal Chocolates e comprando um suco de uvas na Durigan Vinícola (por conta do peso que já trazia de Manaus na mala, não pude comprar os vinhos que tanto queria, mas chocolate comprei bastante!).
COMEÇA A AVENTURA
De volta ao Centro, somos surpreendidos com notícias preocupantes sobre a pandemia: os casos começam a aparecer com mais rapidez. Havia transmissão comunitária confirmada em Santa Catarina. O Museu do Holocausto cancelara todos os agendamentos até segunda ordem naquele dia. Outras atrações da linha Turismo também seriam fechadas. Tivemos sorte em aproveitar. Mas aí as coisas começaram a piorar.
Em Foz do Iguaçu, onde minha amiga Ana Carolina estava há alguns dias com seus pais e me aguardava, o parque das Cataratas e o Marco das Três Fronteiras, que eu pretendia visitar novamente, fecharam para visitação e tive que pedir reembolso, além de cancelar minha reserva no hotel (foi uma luta que cancelassem, pois se eu o fizesse teria que pagar multa, mas eles entenderam a situação e um tempo depois a reserva foi cancelada sem custos).
Eu e Litamar começamos uma verdadeira via crúcis. Eu iria embarcar na quinta-feira, dia 19, para Foz do Iguaçu, e ela seguiria de ônibus para Itajaí no mesmo dia. Com esses contratempos e com o anúncio de que a fronteira entre Paraná e Santa Catarina seria fechada para o transporte intermunicipal, corremos para ir atrás de passagens de ônibus - ela já havia comprado a dela antes, eu comprei naquela terça-feira pelo aplicativo Clickbus para Florianópolis, depois de cancelar os voos Curitiba-Foz do Iguaçu pela Azul e Foz do Iguaçu-Florianópolis pela Gol. Foi uma novela receber o reembolso sem custo da Azul, enquanto com a Gol foi imediato e tranquilo.
Com a mudança de planos, eu resolvera ir para Palhoça, onde minha prima Márcia me aguardava (ela havia mudado de Manaus para lá no início do ano). Florianópolis estava em quarentena. Estava tudo encaminhado, mas quando chegamos à rodoviária na quarta-feira, dia 18, fomos surpreendidos com o cancelamento de todas as viagens, pois acreditávamos que só iriam acontecer na quinta-feira. Meu plano B, caso não achasse uma solução para sair de Curitiba, seria voltar ao hotel (ainda tínhamos uma diária, pois resolvemos sair um dia antes) e remarcar para aquele dia meu voo de volta para Manaus. Mas depois de muita consulta a aplicativos de corrida, conseguimos fechar com uma motorista do Uber, Elaine, super educada e prestativa, que literalmente nos resgatou de Curitiba e nos deixou em Santa Catarina (Litamar em Itajaí, eu em Palhoça) numa viagem que durou umas quatro ou cinco horas. Claro que ela faturou mais do que o previsto por conta da disponibilidade e gentileza. Mereceu mesmo!
Nesse ponto, lembro que todo esse dia foi marcado por uma tensão terrível por conta de informações falsas que estavam sendo repassadas. Uma delas era de que a fronteira entre Paraná e Santa Catarina estava totalmente fechada e vários carros estavam sendo impedidos de passar. Na verdade, apenas os ônibus intermunicipais estavam proibidos. Carros de passeio e caminhões de carga passaram livremente. Foi a partir desse terrorismo que passei a odiar com muito mais força as fake news, correntes e notícias alarmistas compartilhadas via redes sociais.
FÉRIAS ENCURTADAS
Estava em Palhoça, na grande Florianópolis, no continente, hospedado com minha prima Márcia. Ela e os demais colegas de trabalho tiveram que ficar em casa, então foram dias de matar saudades e, principalmente, tomar birita todo dia para animar, já que não podíamos sair (o isolamento foi cumprido com sucesso em Palhoça. As pessoas levaram mesmo a sério e não se via gente à toa andando pelas ruas). Apenas um dia, na sexta-feira, demos uma escapada para eu conhecer a Praia de Fora, onde compramos mariscos para acompanhar a cervejinha da noite.
A praia é linda, como tudo no litoral de Santa Catarina, mas como havia as restrições com aglomerações, estava praticamente vazia. Um homem em sua cadeira de praia lendo, uma mulher se bronzeando, dois rapazes brincando de bola, moradores locais vendendo os mariscos. Só. Os demais estavam em seus pátios, tomando suas bebidas, conversando. Um ou outro saia na rua para caminhar um pouco.
Caminhamos ao longo da praia, tiramos fotos e retornamos para a casa de Márcia. Foi o único passeio que fiz em Santa Catarina. Nos dias seguintes, nosso programa foi ir ao supermercado, assistir lives ou ouvir música e beber muuuuuita cerveja!
Aí havia um problema para resolver: como estavam havendo cancelamentos de voos, eu precisaria voltar a Manaus antes do planejado, já que, se fosse para ficar trancado em casa, era melhor ficar na minha, pois minha mãe e minha irmã estavam preocupadas com tantas notícias ruins que viam pelos telejornais. Minha passagem para o retorno no dia 29 de março estava inalterada, mas como eu ainda possuía milhas Smiles reativadas do cancelamento da viagem Foz-Floripa, usei para procurar uma passagem de retorno para o mais perto possível. Consegui para o domingo, dia 22, mas como garantia mantive a do dia 29. Vai que...
Felizmente, deu tudo certo. Despedi-me no domingo à tarde de Márcia, apanhei um Uber e fui para o aeroporto de Florianópolis. Foi triste ver aquela cidade absurdamente quase vazia e quieta. Apenas passei por ela e lembrei-me das viagens anteriores.
Ao chegar ao aeroporto, depois de despachar bagagem e aguardar o embarque, descobri que o voo do dia 29 havia sido cancelado pela Gol. O saldo foi restituído. Pouparam-me um trabalho.
E assim minhas férias foram encurtadas, mas ainda assim bem aproveitadas. Claro que voltarei um dia, quando tudo estiver sob controle, para curtir a viagem da melhor forma. Não foi ruim. Deu para me divertir. Não me arrependo de nenhum dia.
Então, até breve, Curitiba! Tenho que voltar para resolver essas pendências.
E O RESTO...
A viagem que duraria 16 dias ficou restrita a nove por conta da covid-19. Meu voo de volta teve conexão no Galeão, o que já me deixou preocupado porque o Rio de Janeiro estava disparando em número de casos. Usei uma máscara tipo N97 (conseguida por uma amiga da Márcia) no retorno porque acabei ficando resfriado em Palhoça (basta mudar o clima repentinamente e isso acontece). Cheguei em casa de madrugada cumprindo os protocolos de higienização da mala e da mochila, tirando roupas e sapatos na garagem para colocar no cesto de roupas sujas e em seguida tomei um belo banho.
Esses alarmes que se repetiram tanto nessa fase inicial da pandemia me deixaram mal, a ponto de eu pedir que parassem de me mandar notícias sobre ela (geralmente eram aqueles alarmismos e mentiras) porque realmente estavam me afetando a ponto de ficar à beira de uma crise de depressão. Por isso criei mais raiva ainda de propagadores de fake news.
Minha próxima viagem de férias seria para o roteiro Vitória/ES-Porto Seguro/BA-São Luís/MA, mas cancelei tudo depois do início dessa crise. Com mais calma, optei por usar o crédito da Gol para voltar ao Ceará em agosto, quando pretendo finalmente conhecer Juazeiro do Norte. Se ela vai acontecer, vai depender da situação da pandemia até a metade de julho. Até lá, tentarei manter a fé em coisas positivas, apesar do comportamento da população e dos governantes me fazer crer no contrário.
Vamos aguardar!