quinta-feira, 21 de junho de 2012

Manaus: propaganda e realidade

Ontem, em um dos intervalos comerciais noturnos da televisão, me deparo com uma propaganda da Prefeitura Municipal de Manaus enaltecendo os "avanços" da atual administração de minha cidade (onde nasci, onde cresci, estudei, tive oportunidades e onde minhas raízes estão fincadas, a princípio definitivamente, portanto, MINHA cidade, MEU lar). Como já estou, de acordo com o vocabulário popular, de saco cheio "até o talo" dessa publicidade oficial a la Pollyana, fiz como sempre: apenas olhei e fiquei aguardando o término.

Essa noite, porém, um personagem me chamou a atenção: um rapaz todo sorrisos dizia com orgulho (duvido que autêntico, pois, afinal, é propaganda) que sua (?) cidade havia mudado para melhor, e uma das coisas destacadas foi que os "motoristas paravam na faixa" para permitir a travessia dos pedestres tão logo eles davam o sinal - as faixas vermelhas instaladas em várias vias da capital amazonense, teoricamente para facilitar as travessias principalmente em ruas de tráfego intenso. 

Ora, já bastava ouvir um suposto universitário afirmando, em outra peça publicitária da Prefeitura, que finalmente podia entrar em ônibus novinhos em folha e que nunca estavam lotados. Isso talvez em um sonho, uma realidade alternativa, um universo paralelo ou seja lá o que for, não em Manaus. O outro rapaz falando em educação de motoristas foi o fim da picada!

Nos quinze minutos (em média) do caminho de casa para o meu trabalho, passo por várias dessas faixas. Em frente ao Fórum Henoch Reis, na rua Valério Botelho de Andrade, São Francisco, existe uma. Nas avenidas Maceió e Mário Ypiranga há outras (na primeira,existem duas no meu trajeto). São inúteis. Antes eu ia até essas faixas e ficava fazendo o gesto tão divulgado em outras propagandas oficiais (erguer o braço horizontalmente) para que os carros, a esse sinal, parassem para permitir nossa travessia. Posso dizer tranquilamente que dois a cada dez motoristas são educados o suficiente para tal ato. Os demais simplesmente o ignoram ou são terrivelmente idiotas a ponto de acharem que você está fazendo sinal para um táxi ou um ônibus (mesmo que você não esteja em uma parada). Houve uma vez, na avenida Maceió, que passei pelo menos cinco minutos naquela faixa até aparecerem dois motoristas conscientes que pararam e permitiram minha travessia. Cinco minutos é uma eternidade para quem quer atravessar uma rua! Com alguma sorte, quando há uma pessoa idosa ou mulher grávida, a sensibilidade desses motoristas se aguça e eles param devidamente (com alguma sorte, friso bem, porque a maioria, se a impunidade fosse maior do que já é, simplesmente atropelariam, sem remorso algum, qualquer pessoa).

Bom, agora voltei ao lado selvagem do trânsito. Não adianta me deslocar para essas faixas e perder tempo. O jeito é arriscar a vida atravessando em outros lugares, porque não vai fazer diferença. Daí o fato de o rapaz dizer que "os motoristas param na faixa" me fizeram, em bom português, "subir nas tamancas". Não critico a Prefeitura por querer mostrar seu trabalho, seja ele bem ou mal feito para nós. É o papel da propaganda, é o papel de todo administrador. Se falar na falta de educação do povo, vai ser malhado, pode esquecer reeleição ou qualquer outra coisa. O negócio é não mexer na ferida da ausência quase total de colaboração da população com o administrador municipal. 

Outro exemplo de como isso incomoda: a Prefeitura mostra o complexo da Ponta Negra lindo, perfeito, mas não mostra que uma cambada de porcalhões danifica o patrimônio público, joga lixo por todos os lados, ultrapassa os limites da poluição sonora. Isso deveria ser mostrado em campanhas ostensivas, fazer o babaca se enxergar nesses trabalhos de conscientização. Só dizer o que deve ser feito e o que não deve ser feito não basta. Mas pelas razões que expus anteriormente, para eles é melhor não mexer com o eleitor. Pelo menos é o que parece.

Opções? Vamos ver o que existe por aí:

1) semáforos para pedestres: é aparentemente a melhor ideia. O transeunte aperta o botão e espera o sinal vermelho para os condutores pararem, podendo, assim, fazer a travessia tranquilamente. Porém, há vândalos na cidade, vagabundos sem  noção de vida em sociedade. Se quebram uma "corujinha", como foi noticiado por esses dias, imagine esses semáforos de fácil acesso. Quando não é o vândalo, é o transeunte equivocado, que insiste em apertar o botão do semáforo várias e várias e várias vezes, a exemplo do cidadão que pressiona seguidamente o botão de chamada do elevador, como se isso fosse tornar o equipamento mais rápido. De tanto ser "amassado", o equipamento acaba pifando. Ainda há mais um efeito colateral: a retenção do tráfego em avenidas de grande movimento.

2) passarelas: alternativa mais segura, mas infelizmente ignorada por uma boa parte da população. Eles preferem ziguezaguear entre os carros a fazer um pouco de exercício subindo escadas ou rampas. Na avenida André Araújo, nas proximidades da Secretaria de Estado da Fazenda, é possível ver essa situação: pessoas se arriscando sob a passarela que poderia eliminar riscos de atropelamento. Depois que sentem no lombo o peso do veículo, querem culpar a Prefeitura, o governo, a Dilma ou o Papa. Claro, ninguém admite que é idiota, por maior que seja o tamanho de sua inconsequência.

3) educação para o trânsito: bem feita, mostrando a boa vontade em incentivar as pessoas a cumprir seu papel. Mostra como é possível haver civilização nas ruas de Manaus e como deve ser a participação de cada um - pedestre ou motorista. Surtiu efeito? Imediato, não, e também seria impossível. Mas não vejo sinais de que a longo prazo isso aconteça.

É, senhores administradores, a coisa está feia. Que tal algo mais radical? Em meu trabalho, cheguei a comentar que estava prestes a tomar uma atitude para fazer certas pessoas vestirem a carapuça da imundície: colocar no banheiro masculino do nosso andar (e conseguindo uma cúmplice para fazer o similar no banheiro feminino) uma placa com os seguintes dizeres: "Não transforme este banheiro em seu chiqueiro particular. Não jogue guimbas de cigarro nos mictórios nem deixe papéis-toalhas jogados sobre as pias" e outras coisas. Ou seja, nada de palavras bonitas ou eufemismos, mas sim que atinjam diretamente na essência os porcalhões, mostrando que há quem se importe, quem saiba como esses imundos são. E me referi a educação ambiental. No trânsito, a coisa é mais complicada, porque lida com tempo - as pessoas hoje vivem com pressa para tudo, mesmo sem razão aparente, e são egoistas a ponto de não ligar para regras e campanhas, como bem se vê.

Enquanto isso, a Manaus ideal só existe na publicidade - de certa forma, enganosa.

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