Quando fiz o concurso público para o cargo de assistente judiciário no Tribunal de Justiça do Amazonas, em 2005, fui motivado pela necessidade de um trabalho fixo e seguro, já que comecei a ficar saturado e desmotivado com o “andar da carruagem” no jornalismo amazonense – um quadro que havia mudado muito desde que nele eu ingressara, em 1995, ainda estudante, tendo se tornado um meio de disputas desonestas, intrigas de colegas e beneficiamento de pessoas sem qualificação mas com uma “invejável” capacidade de “babar ovos”. O salário, para um homem solteiro, era – e ainda é – um atrativo à parte. Valia a pena arriscar? Trabalhar no Judiciário?
Desde que assumi minhas atividades em junho de 2007, participei de um momento especial. Fui o segundo funcionário da recém criada 9ª Vara Criminal, hoje o segundo mais antigo do quadro do Juízo. Em reconhecimento ao meu trabalho, fui indicado e ganhei uma função de assistente da diretora da vara, devidamente remunerado. Na parte financeira, não tenho do que reclamar, pois com tantos problemas o Judiciário conseguiu aos poucos resolver uma série de pendências em relação aos seus funcionários.
Ainda temos muitas questões a resolver – a virtualização total das varas, uma meta perseguida há tanto tempo e ainda não integralmente implantada no TJAM e que seria fundamental para a agilização na tramitação processual e até mesmo da organização estrutural dos cartórios; a reestruturação física para termos um ambiente adequado de trabalho; a informatização integral das comarcas; e por aí vai. O que temos já é um avanço, considerando-se a situação encontrada quando ingressei no Tribunal em 2007: um cartório com poucos funcionários, processos se acumulando por falta de pessoal para auxiliar, falta de controle dos prazos, ausência de capacitação e outros.
Aí começaram as “porradas”: apesar de termos nosso horário estabelecido legalmente em seis horas diárias, passamos a trabalhar uma hora a mais, pois isso, segundo a visão do Conselho Nacional de Justiça, ajudaria na celeridade do Judiciário. Sete horas diárias sem direito a uma compensação salarial, pois conforme nosso Plano de Cargos e Salários, se por necessidade do trabalho o servidor permanecer além da carga normal, teria por direito o acréscimo de 25% no salário sobre o vencimento. Isso nunca aconteceu e certamente nunca vai acontecer. O Tribunal Pleno vai se reunir para decidir a nova investida do CNJ para “modernizar” a Justiça: o novo aumento da carga horária para os trabalhadores do Judiciário, que agora deverão trabalhar das 9h às 18h, “no mínimo” - espero que vejam que este horário já é seguido de 8h às 18h, sendo em esquema de plantão a partir das 15h (já o era antes, quando o horário era até as 14h. Enquanto isso, os problema estruturais do TJAM (e dos demais tribunais estaduais, diga-se de passagem) permanecem sem solução.
Não sei em que o CNJ se baseia para achar que aumentar a quantidade de horas trabalhadas vai ajudar a acelerar o Judiciário se a nossa estrutura continua problemática. Tomo como exemplo a 9ª Vara Criminal: temos quatro audiências por dia, mas é raro o dia em que todas acontecem. Por várias razões, há fracassos: os oficiais de Justiça estão sobrecarregados e não têm tempo para cumprir em tempo hábil as intimações; no caso de conduções coercitivas de testemunhas (aquelas que foram devidamente intimadas mas deixaram de comparecer ao ato injustificadamente, sendo agora levadas pelo oficial para a audiência), não há carro disponível para o cumprimento da diligência; as testemunhas deixam de comparecer quando são intimadas; os advogados não atendem as intimações; e uma série de outras causas que independem da boa vontade dos servidores.
Boa vontade, sim! Trabalhar no TJAM para mim foi encontrar uma forma melhor de ser útil, contribuir com a agilidade do Judiciário. Pelo menos em nosso cartório, os processos fluem normalmente porque as tarefas são bem divididas e há comprometimento, algo até estranho – para não dizer surreal – quando se trata de serviço público.
A questão do horário está em discussão no Tribunal Pleno. Vamos ver se, a exemplo do que tem acontecido até agora, essa imposição do CNJ vai ser aceita passivamente e sem questionamentos (apesar de o quadro de servidores demonstrar contentamento com essa possibilidade de aumento da carga horária) ou se, em uma atitude mais racional, o TJAM se recusará a atacar o problema pelo lado errado. Afinal, como se tem discutido nos corredores das unidades do nosso Judiciário, em nada a Justiça terá melhorias com funcionários sobrecarregados de trabalho mas ainda sem condições adequadas. Servidores insatisfeitos e falta de estrutura adequada vão resultar em uma Justiça mais ágil? Talvez somente na estranha equação do CNJ...
Depois de passada essa fase de tempestade, voltarei a perguntar: vale a pena trabalhar no Judiciário?