quarta-feira, 31 de julho de 2013

Comentário: "Hitchcock" (2012)


Todo cinéfilo que admira a obra do cineasta inglês Alfred Hitchcock (1899-1980) sabe a grande parceira que o Mestre do Suspense teve em sua esposa Alma Reville (1899-1982). Graças a ela, uma das maiores obras-primas do gênero, “Psicose”, de 1960, por pouco não foi um tremendo fiasco que macularia a imagem do marido. É essa a história que Sacha Gervasi nos traz em “Hitchcock” (Hitchcock, 2012): a relação entre Alma e Alfred em um momento de crise criativa do cineasta – problema que se estende ao casamento que já durava três décadas.

No filme, logo após a festejada premiére de “Intriga internacional”, de 1959, Hitchcock (magnificamente “restaurado” fisicamente e pela interpretação impecável de sir Anthony Hopkins) é questionado por um repórter se, àquela altura, nos seus 60 anos de idade, não estaria na hora de “sair de cena”. Um pequeno salto de poucos anos nos traz o inglês em busca de uma nova história para levar às telas. É quando descobre o livro “Psicose”, de Robert Bloch, um relato sobre um assassino em série – escolha que faz a imprensa e os produtores torcerem o nariz.

Alma Reville (Helen Mirren, como sempre uma atriz de talento respeitável) também discorda do marido sobre sua decisão de transformar uma história muito violenta em filme. Nessas idas e vindas surge Whitfield Cook (Danny Huston), roteirista que tenta aproveitar o momento para aproveitar sua amizade com Alma e usá-la para “empurrar” um roteiro para Hitchcock.

O foco do filme, porém, não fica centrado nos bastidores de “Psicose”. Acima disso, está a relação estagnada entre Alfred e Alma – ele, obcecado pelas suas protagonistas lindas e louras como Grace Kelly e Kim Novak, guarda fotos delas em sua escrivaninha. A descoberta de Alma sobre essa paixão secreta – ela, já cansada dos flertes do marido com suas estrelas, como Janeth Leigh (Scarlett Johanson, perfeita), escolhida para ser a desafortunada protagonista de “Psicose” – acaba aproximando-a de Whitfield na ajuda em melhorar o seu roteiro. Alfred passa a questionar a fidelidade da esposa, gerando interferência até mesmo nas filmagens da futura obra-prima. 
 
O filme em si funciona até mesmo com uma homenagem a Hitchcock. O prólogo segue o estilo usado pelo cineasta na famosa série “Alfred Hitchcock apresenta”: uma situação que termina em crime, observada pelo inglês, que a partir dali narra – com seu sutil senso de humor negro - o que acontecerá em seguida. Os devaneios do personagem em seus diálogos imaginários com o assassino em série Ed Gein (Michael Wincott), inspirador de Bloch ilustram um pouco do processo criativo que resultou em um dos mais originais filmes da década de 1960 e um marco no cinema de suspense.

Mas a verdadeira heroína de “Psicose” acaba sendo, no final das contas, a própria Alma, que tomou para si a tarefa de reeditar a película para transformá-la, de fato, no espetáculo no qual se tornou. Foi o seu afeto ao marido, afinal, que imortalizou o atormentado Norman Bates na história da sétima arte. Emocionante, para dizer o mínimo!

Publicado no caderno Plateia, jornal Amazonas em Tempo, edição de 28/07/2013, sob o título "O amor por trás da obra-prima"

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