quarta-feira, 24 de abril de 2013

Comentário: "A morte do demônio" (Evil dead, 2013)


Mia (Jane Levy), possuída, é mantida no porão da cabana

Em 1981, Sam Raimi lançou “A morte do demônio” (Evil dead) para ganhar destaque no gênero terror “gore” (extremamente sangrentos) - muito em evidência naquela década. O argumento era o mais simples possível: cinco jovens alugam uma cabana isolada em uma floresta para se divertirem em um final de semana. Ali, no porão, encontram uma publicação chamada Livro dos Mortos e uma gravação do morador anterior da casa, por meio da qual, acidentalmente, acabam liberando entidades malignas que os possuem um a um, levando-os a se massacrarem. Banhos de sangue, violência, decapitações e esquartejamentos causaram furor aliado à manipulação criativa de câmera, tornando o filme um marco do gênero – de fato, um clássico da época dos “slash movies” como “Sexta-feira 13”, “Pássaro sangrento” e “Demons” e um modelo repetido exaustivamente por anos a fio.

Sheryll (Ellen Sandweiss) no original de 1981
A refilmagem, agora dirigida por Fede Alvarez. e produzida por Raimi (e Bruce Campbell, protagonista da primeira versão), em cartaz desde sexta-feira (19) na capital, mantém o argumento original com um toque a mais – os cinco jovens isolam-se na cabana pertencente à família de dois deles, David (Shiloh Fernandez) e Mia (Jane Levy) - irmãos, como Ashley (Campbell) e Shelly (Ellen Sandweiss) no original - em uma tentativa de livrar esta última do vício das drogas. Outros pontos comuns mais evidentes com o original são a própria cabana, com seu balanço da varanda, e o seu porão fechado a correntes. Os famosos movimentos de câmera que se tornaram marca registrada do primeiro filme ficam restritos a poucos momentos.

As semelhanças acabam aí. Nessa nova versão, existe um prólogo que tenta explicar, ainda que de forma obscura, a presença do mal. Também há uma exploração maior das relações entre os personagens. Fica claro que David está tentando se aproximar de Mia após a morte da mãe de ambos. Para tentar livrá-la das drogas, ele conta com a ajuda da namorada Natalie (Elizabeth Blackmore) e os amigos Olivia (Jessica Lucas), enfermeira, e Eric (Lou Taylor Pucci) - o qual irá encontrar o livro macabro e, ao ler algumas passagens, acidentalmente invocar os espíritos malignos adormecidos na cabana.

O elenco da primeira versão de "A morte do demônio": trash gore
 Quem esperar um remake das cenas antológicas da primeira versão, como o esquartejamento de uma das garotas possuídas, o estupro na floresta e a decapitação de outro personagem, pode ficar decepcionado. A violência é menos crua, ainda que as cenas sejam realmente fortes porém mais “refinadas” - enquanto a primeira versão abusava dos closes de mutilação, a nova tem algo de certa forma estilizado. 

Elenco da nova versão, de 2013: roteiro mais elaborado e efeitos "clean"
Inevitável, para os que conhecem o original, não fazer as comparações,mas colocando-se isso de lado, o novo “A morte do demônio” cumpre bem seu papel de deixar o espectador tenso, com repulsa e até mesmo divertido. Pelo menos até a meia hora final, onde uma reviravolta com os personagens de David e Mia acaba estragando tudo, em um claro lapso de roteiro e continuidade que não convence o olhar mais atento – sem contar que em certos momentos temos a impressão de estarmos vendo personagens de algum filme da franquia dos mortos-vivos, pela forma como se movimentam – ou no caso da cena final, uma espécie de arremedo de Jason Voorhees, o assassino imortal da série “Sexta-feira 13”.

“A morte do demônio” de 2013 tem mais efeitos realísticos, um enredo mais sólido e um final que talvez não agrade os fãs do original. Na dúvida, melhor ficar com o de Sam Raimi.

(Publicado no caderno Plateia, jornal Amazonas em Tempo, edição de 23/04/2013)


Semelhanças e diferenças (COM SPOILERS)

Enredo: em 1981, a história se limitava a mostrar um grupo de amigos (Ashley/Bruce Campbell), sua irmã Sheryll (Ellen Sandweiss), sua namorada Linda (Betsy Baker) e o casal Scott (Hal Delrich) e Cheryl (Sarah York) que alugavam uma cabana isolada para passarem o final de semana. No filme de Alvarez, as situações são parecidas e ainda entra em cena o cachorro Grandpa.

As possessões: os espíritos malignos começam a possuir cada um dos personagens na mesma ordem que no filme original, mas enquanto naquele os demônios despertam com a execução de uma gravação, neste o personagem Eric lê as frases evocativas escritas no Livro dos Mortos, iniciando toda a tragédia. Curiosamente, na segunda versão podemos ouvir frases da primeira, em suas vozes originais (como no início da possessão de Mia), e uma das gravuras da publicação macabra lembra o cartaz original do filme de 1981.

O local: as cabanas dos dois filmes são idênticas, até mesmo com o balanço da varanda, que no primeiro filme sacudia sozinha, ajudando no clima sinistro do lugar. No porão, com uma escada oculta por um alçapão, são encontrados centenas de gatos mortos usados no ritual do prólogo, elemento inexistente na primeira versão.

As mortes: no filme de Raimi, a única forma de eliminar os demônios era o desmembramento do corpo possuído. Na segunda versão, mais duas alternativas aparecem: queimar o hospedeiro ou enterrá-lo vivo. David decide enterrar a irmã possuída. Dessa forma, expulsa o espírito maligno e Mia retorna, sem uma mutilação sequer. Foi aí que o filme descambou para o absurdo inaceitável...

terça-feira, 16 de abril de 2013

Comentário: "O bebê de Rosemary" (Rosemary's baby, 1968)


Lançado em blu-ray há pouco mais de dois meses, “O bebê de Rosemary” (Rosemary’s baby, Estados Unidos, 1968) lidera minha lista dos melhores filmes de terror psicológico da história do cinema. Apostando apenas no clima sombrio e no ponto de vista da personagem principal, o diretor Roman Polanski deixou sua marca nesta obra-prima que até hoje pode assustar aos conseguem envolvimento na história, adaptada do romance de Ira Levin – escritor que colecionaria mais sucessos literários transportados para as telas, como “Os meninos do Brasil”, “Um beijo antes de morrer” e “As esposas de Stepford”.

O casal Rosemary (Mia Farrow) e Guy Woodhouse (John Cassavetes) – ela uma jovem ingênua, ele um ator iniciante e ambicioso – conseguem alugar um apartamento amplo no edifício Bramford, em Nova York, por uma verdadeira pechincha. Nem mesmo a história sinistra do imóvel – palco de casos de satanismo e rituais de canibalismo – ou o fato de a proprietária anterior ter morrido misteriosamente tira o ânimo do casal em começar uma nova vida. 
 
Entre o contato com os novos – e na maior parte idosos – moradores do Bramford, o casal se envolve com os Castevet: Minnie (Ruth Gordon, que levou o Oscar pelo papel) e Roman (Maurice Evans), sempre solícitos após uma tragédia que vitima sua filha adotiva. Em uma determinada noite, Rosemary tem um pesadelo no qual é estuprada por uma criatura de quem só consegue ver os olhos oblíquos e amarelos, violência assistida pelos Castevet, Guy e os demais moradores do Bramford. Dias depois, ela descobre que espera um bebê.

A partir dessa gravidez, Rosemary começa seu calvário: acontecimentos estranhos a fazem acreditar que a criança em seu ventre é alvo de uma conspiração satânica orquestrada pelos Castevet com a colaboração de Guy. Ao contrário das grávidas comuns, a jovem emagrece, come carne crua e sente dores assustadoras. A única pessoa em quem confia nesse momento é Hutch (Sidney Blackmer), escritor e amigo do casal. Mas Hutch subitamente entra em coma, levando a jovem mãe a entrar em um redemoinho de pânico alternado com momentos de tranquilidade, até descobrir a verdade sobre a noite do pesadelo, Guy e sua relação com os Castevet – e do próprio edifício Bramford.

Ao dirigir “O bebê de Rosemary”, Polanski manteve-se o mais fiel possível ao original de Ira Levin. Assim, todo o filme transcorre a partir do ponto de vista da protagonista, tornando o espectador seu cúmplice e levando-o a experimentar todo o temor que a consome. Minha maior diversão, ao rever este filme – mais de 20 vezes, sem enjoar -, é descobrir as “pistas” sobre a trama diabólica da qual a jovem Rosemary é vítima, interpretando detalhes dos pesadelos e pequenos gestos dos demais personagens. A trilha sonora é um espetáculo à parte, pontuando cada cena e contribuindo para o clima de tensão e medo. 
 
Visto hoje, “O bebê de Rosemary” pode parecer, para muitos, ultrapassado. A cena final da revelação deve deixar alguns decepcionados, mas isso fica para quem não gosta de seguir a lógica das histórias – o que é muito comum hoje em dia, com efeitos espetaculares escondendo a fraqueza dos roteiros. Para quem gosta de cinema de verdade, é uma joia eterna. Para se assustar, basta ver a reação de Rosemary diante do berço negro e sua pergunta desesperada: “O que vocês fizeram com os olhos dele?”.


(texto publicado no caderno Plateia, jornal Amazonas em Tempo, em 31/03/2013)

VIAGEM: Cabaceiras, PB (06/04/2024)

Pela terceira vez viajei à Paraíba nas férias - e a primeira vez com meu marido Érico -, e essa foi a oportunidade de realizar um sonho, alé...