domingo, 26 de agosto de 2012

Minha vida de foca: baixaria no Katikero

Era uma noite de domingo em 1996. Plantão no Jornal do Norte. Lembro que eram quase 21h e eu já estava de saída para casa quando o diretor de redação Hiel Levy me chamou. Confusão no bar Katikero, maior quebradeira, briga e blá-blá-blá. Fui à missão acompanhado do repórter fotográfico Alberto César Araújo.

O bar Katikero existe até hoje. Fica localizado na avenida Floriano Peixoto, Centro de Manaus, a poucos metros do cruzamento com a rua José Paranaguá, nas proximidades do antigo quartel da Polícia Militar. Não chega a ser um lugar mal frequentado: é um dos raros pontos de encontro ainda resistentes no Centro, reunindo trabalhadores daquela área para um happy hour, e até funciona como restaurante salvo engano.

Naquela noite em questão, ao nos aproximarmos, o cenário era bem diferente. Em vez de polícia, curiosos, mesas jogadas, garrafas quebradas e tudo o que possa lembrar um campo de batalha urbano, só havia um homem parado em frente ao bar. E este estava fechado. Não entendi mais nada, porém fomos até o cidadão e vimos que se tratava do Celso, na época editor executivo do Jornal do Norte.

Celso estava parado na calçada do Katikero, em pé. Aos seus pés, um pequeno maço de dinheiro - notas de R$ 10, R$ 5 e R$ 1, se bem me lembro. Ele havia ligado para a redação. O problema: depois de ter tomado uma ou duas cervejas, ele dera uma nota de R$ 50 para pagar. No entanto, o troco viera incompleto. Faltavam exatos 25 centavos!

Era isso. O circo estava armado por causa de 25 centavos que faltavam para completar o troco. Inacreditável que eu e Alberto estávamos ali por conta da birra do colega. Em vez de gente ferida, garrafas quebradas e todo tipo de dano que uma baderna em boteco pode gerar, estava o editor do jornal inconformado em não receber míseros 25 centavos de troco. Ainda fossem R$ 25, eu até entenderia. Mas vida de foca é uma desgraça: fosse hoje, eu daria ao chefe o tão choramingado dinheirinho para encerrar aquela papagaiada. O jeito era esperar para ver.

Mas a pauta idiota não foi nada. Pior foi a baixaria que se seguiu. O dono do bar morava no prédio onde funciona o Katikero (não sei se hoje ele ainda reside lá ou se permanece proprietário do boteco) e viu, lá de cima, a movimentação do cliente chato e da equipe de repórteres. Ele já desceu com 200 pedras na mão, esculhambando todo mundo. Eu fiquei de braços cruzados observando a cena. Sobrou para o Alberto, coitado. O cidadão, que tinha quase uns dois metros de altura, achou que o fotógrafo havia tirado fotos dele, agarrou-o pelos braços e o sacudiu, ameaçando-o caso fosse publicado algo, apesar de Alberto haver garantido não ter feito fotografia alguma. Foi um corre daqui e dali para acalmar o elemento, até a esposa dele se meteu para acalmar a besta fera. Enquanto isso, Celso somente dava um sorriso debochado. Satisfeito em ter irritado o cidadão, recolheu seu rico dinheirinho e foi embora. Voltamos para a redação, eu e o Alberto, fulos da vida, contamos o que havia acontecido e pronto. Muitas risadas, nada de matéria, nada de fotos, nada de nada. Plantão encerrado.

Nem preciso dizer que essa aventura frustrada foi a gozação da semana para mim e para o Alberto, que quase apanha por causa do falso alarme criado pelo nosso chefe maluco. Nunca havia sequer entrado no Katikero, mas depois daquela palhaçada toda nem fiz questão. Quanto ao Celso, algum tempo depois foi demitido ou pediu demissão do jornal, não lembro ao certo. Eu só pude dizer: "já vai tarde". E levou minha vontade de esganá-lo.

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