sábado, 31 de março de 2012

Gênio, sim; tarado, nunca!


Lá se vão 100 anos desde que Nelson Rodrigues chegou a este mundo para fazer a diferença na história do teatro brasileiro. Sua vida pessoal, marcada por tragédias (maravilhosamente retratada na biografia "O anjo pornográfico", de Ruy Castro, que eu recomendo), foi a inspiração para seus contos e principalmente suas peças. Lógico, não demorou para suas obras servirem como fonte de histórias para o cinema.

Nem todas foram bem sucedidas. Algumas, em vez de aproveitarem a essência da obra, ficaram centradas na exposição gratuita de nudez e perversões sexuais chocantes. Outras conseguiram ir além e tiveram desempenho à altura de Nelson Rodrigues. Nas primeiras, o dramaturgo era apenas um tarado. Nas demais, teve reconhecida sua genialidade.

A seguir, o melhor e o pior das adaptações de Nelson Rodrigues que eu já assisti. Difícil é não se identificar de alguma forma com as características psicológicas de seus personagens. Nelson é Nelson e será sempre único em sua área.

Bonitinha, mas ordinária (1963), de J. P. Carvalho
A história de Edgar (Jece Valadão), que recebe do patrão, o dr. Werneck (Fregolente), a proposta de casar-se com Maria Cecília (Lia Rossi), filha de família rica que é estuprada por cinco negros, teve um toque bem sutil nessa adaptação. Rapaz íntegro e com problemas financeiros, Edgar é procurado por Peixoto, outro empregado de Werneck, oferecendo-lhe, em nome do patrão, dinheiro para aceitar o casamento e salvar a honra de Maria Cecília. No entanto, fica dividido entre o matrimônio de fachada e o amor de Ritinha (Odete Lara, lindíssima), jovem que se prostitui para sustentar as três irmãs e a mãe louca. Não há nada explícito e a adaptação deixou um pouco de lado a linguagem teatral, algo que ficaria impregnado em várias adaptações de outras obras de Nelson. Vi no Canal Brasil e gostei muito.

Bonitinha, mas ordinária (1983), de Braz Chediak
Apesar de ter Lucélia Santos (Maria Cecília), José Wilker (Edgar), Vera Fischer (Ritinha) e Milton Moraes (Peixoto), essa segunda versão da peça deixou a desejar, apesar de, no mínimo, simpática. A cena do estupro da personagem pelos negros, que acabou se revelando uma armação da própria "vítima" para satisfazer uma tara, foi bem realista, mas hoje em dia há coisas muito mais cruas na própria televisão. Faltou uma adaptação melhor dos diálogos extremamente teatrais. Ainda assim, confesso que gostei.

A dama do lotação (1978), de Neville de Almeida
A felicidade do casal Carlos (Nuno Leal Maia) e Solange (Sônia Braga, no auge da beleza) acaba logo após o casamento, quando ele a possui a força na noite de núpcias. A partir de então, a mulher evita o marido mas, durante o dia, arranja parceiros sexuais durante suas viagens de ônibus. Nessa obsessão por sexo com estranhos acaba envolvendo até mesmo seu sogro (Jorge Dória). O resultado disso tudo é uma tragédia em família, bem ao gosto do dramaturgo. Essa talvez seja a melhor adaptação de um conto de Nelson Rodrigues, reunido na obra "A vida como ela é". Gostei demais!

Álbum de família (1981), de Braz Chediak
Uma família que se reúne para a tradicional foto de álbum é marcada por relações incestuosas e perversões. Senhorinha (Dina Sfat) tem paixão pelo filho caçula Nonô (Geraldo José), louco que corre nu pela fazenda. Ela também é desejada pelo filho Edmundo (Carlos Gregório), que por conta dessa paixão não consuma o casamento com a esposa. O marido de Senhorinha, Jonas (Rubens Correa), é apaixonado pela própria filha, Glória (Lucélia Santos), que o idolatra. Esta é amada pelo outro irmão Guilherme (Marcos Alvisi), o qual entra em um seminário para fugir à paixão incestuosa. No meio de tudo está a irmã de Senhorinha, Ruth (Wanda Lacerda), apaixonada pelo cunhado a ponto de levar-lhe adolescentes virgens para que ele as deflore, satisfazendo dessa forma o desejo pela própria filha. Toda essa confusão terá resultados trágicos. A adaptação acabou gerando um filme chato, com talentos desperdiçados e roteiro fraquíssimo. Este, sim, valia uma refilmagem.


O casamento (1975), de Arnaldo Jabor
Baseado em romance de Nelson Rodrigues, é uma das melhores adaptações da década de 1970. Conta a história do empreiteiro Sabino (Paulo Porto), apaixonado platonicamente pela própria filha, Glorinha (Adriana Pietro, lindíssima, que morreria naquele ano). A poucos dias do casamento de Glorinha, é avisado pelo médico Camarinha (Fregolente) que este havia flagrado o futuro genro do empreiteiro aos beijos com o enfermeiro Zé Honório (André Valli). A garota relembra fatos recentes, como seu envolvimento com o filho de Camarinha, Antônio Carlos (Érico Vidal), até o instante do casamento. Enquanto isso, Sabino envolve-se com sua secretária, Eudóxia (Mara Rúbia). 

Perdoa-me por me traíres (1980), de Braz Chediak
Outra peça de Nelson Rodrigues que trata de adultério, loucura, prostituição e aborto conseguiu uma boa adaptação (Chediak já havia feito outros filmes sem muito impacto). Glorinha (Lidia Brondi) é confrontada pelo tio Raul (Rubens Corrêa), irmão de seu pai Gilberto (Nuno Leal Maia), após ser descoberta saindo do prostíbulo de Madame Luba (Henriete Morineau), para onde havia sido levada pela colega de escola Nair (Zaira Zambelli). Nesse confronto, Raul acaba contando a história de Gilberto e Judite (Vera Fischer), mãe de Glorinha que havia cometido suicídio quando Glorinha era criança. Nessa retrospectiva são lembradas as traições de Judite, que acaba sendo perdoada pelo marido louco, e a paixão platônica de Raul pela cunhada. Mediano, mas interessante! Vale a pena.

Engraçadinha (1981), de Haroldo Lima Barbosa
Adaptado da primeira parte do romance "Asfalto Selvagem", de Nelson Rodrigues, é uma boa realização de Haroldo Lima Barbosa. Conta a história de Engraçadinha (Lucélia Santos) a partir de suas lembranças narradas a um padre logo após o enterro de seu pai suicida. Nessa retrospectiva, surgem fatos obscuros sobre sua relação com Sílvio (Luiz Fernando Guimarães), noivo de sua prima Letícia (Nina de Pádua), que por sua vez é apaixonada por Engraçadinha. Essa parte da história trata somente da juventude da personagem principal. A melhor exposição de todo o conjunto aconteceria anos depois, com a adaptação para a televisão.

Toda nudez será castigada (1973), de Arnaldo Jabor
Depois da morte da esposa, Herculano (Paulo Porto) entra em depressão. Por obra do cunhado Patrício (Paulo César Pereio), que está de olho em sua fortuna, o empresário conhece a prostituta Geni (Darlene Glória), mulher de bom coração e obcecada pelo medo de desenvolver câncer no seio. Ambos se apaixonam e se casam, mesmo com a oposição das tias de Herculano (as saudosas Henriqueta Brieba e Elza Gomes) e da outra prima (a também saudosa Isabel Ribeiro). Com o casamento, o filho de Herculano, Serginho (Paulo Sacks), fica revoltado, se embebeda e é preso. Na cadeia, é estuprado por um ladrão boliviano. Depois do fato e ao sair da cadeia, torna-se amante de Geni por imposição. Mas tudo não passa de uma armação do jovem para se vingar do pai pelo que ele acha ser desonra à memória da falecida mãe. Outra boa adaptação de Nelson Rodrigues, carregada de humor e com final trágico quase comum a todas as suas obras. Também vale rever sempre!




Black Kiss: Dagmar, Beverly e Cass de volta às bancas!

 
Quem curte histórias em quadrinhos (dos gibis às graphic novels) pode adorar a notícia: a livraria Devir (www.devir.com.br) relançou "Black Kiss", minissérie underground em quatro partes, de autoria de Howard Chaykin (criador de "American Flagg!", outra obra-prima dos quadrinhos adultos) publicada em 1989 no Brasil pela Toviassu (da turma do Casseta & Planeta). Agora o relançamento é em edição de luxo, com capa dura ou brochura.

"Black Kiss" tem uma história de proibições em vários países. Essa obra traz o talento do traço de Chaykin em contar histórias "barra pesada", totalmente voltada para adultos, misturando pornografia, terror, violência e drama policial ao contar o envolvimento do músico de jazz e ex-viciado em drogas Cass Pollack, que ainda por cima é metido no mundo do crime, com Dagmar Lane e Beverly Grove. Explica-se: ao sair da clínica de recuperação, Cass é caçado por integrantes do submundo para um acerto de contas. Nessa caçada, sua ex-mulher e sua filhinha são assassinadas pelos seus persegudires, mas logo as suspeitas recaem sobre o próprio Pollack. Somente quem poderá provar sua inocência é uma loura belíssima a quem deu carona na hora do crime: a ex-atriz Beverly Grove, pega por Pollack durante a madrugada na estrada, visivelmente embriagada, e que, em retribuição à carona, lhe faz sexo oral até o caminho de casa.


Beverly, por sua vez, tem uma relação estranha com Dagmar Lane, uma garota de programa, a qual leva sua idolatria pela amiga a ponto de transformar-se em sua gêmea: somente um pequeno sinal no queixo as diferencia fisicamente. Dagmar também é uma protetora feroz de Beverly. No começo da história, ela causa uma explosão em que mata Frank Murtaugh, um padre pervertido, e uma jovem prostituta  chamada Cindy Franks, usada como isca para atrai-lo a uma armadilha. O objetivo do atentado: destruir um filme bizarro sobre Beverly, usado para chantagear a ex-atriz e guardado com o sacerdote. No entanto, os planos não dão certo: uma mulher disfarçada de freira consegue retirar o filme da casa onde o padre e a garota estão entretidos com sexo e parte para a chantagem pesada com as duas "irmãs".


Dagmar e Beverly resolvem ajudar Cass a provar sua inocência, no entanto, ele precisará obter o filme misterioso de volta das mãos de um grupo de pervertidos sexuais que querem um "serviço" para que a ex-atriz o tenha de volta. Para completar a confusão em que Pollack se mete após o assassinato da família, um dos seus perseguidores, Erick Fabriant, é amante de Dagmar. O círculo está fechado para uma série de reviravoltas e descobertas nada convencionais, doses de sexo bizarro (orgias, necrofilia e estupros), violência brutal e um quê de sobrenatural. Dizer mais que isso seria estragar as surpresas que "Black Kiss" reserva para quem não conheceu esse trabalho de Howard Chaykin, que já anunciou uma continuação da história para este ano. Agora é o momento certo!

Comentário: "Fatalidade" (A double life, 1947)


O veterano ator de teatro Anthony John (Ronald Colman) está obcecado por interpretar o personagem Othelo com uma mudança em uma das cenas clássicas da peça de Shakespeare, em que o rei mouro mata por ciúmes sua amada Desdêmona: na visão de Anthony, o estrangulamento da suposta adúltera seria por um beijo. A ideia é bem aceita pelos seus produtores, no entanto o aprofundamento do artista no personagem shakesperiano o atinge de tal maneira que não consegue mais distinguir realidade e ficção.

Esse é o argumento de "Fatalidade", filme dirigido por George Cuckor em 1947, rendendo a Ronald Colman o Oscar daquele ano. É uma história sombria na qual o ator mergulha tanto em seu personagem que perde o equilíbrio entre a arte e a realidade, fundindo a história de Othelo, que cometeu um crime levado por ciúmes, com a do próprio Anthony John - divorciado há dois anos de sua colega de profissão Brita (Signa Hasso), mantém com ela uma bela amizade, abalada eventualmente por sua crise de ciúmes da atriz com o assessor de imprensa Bill (Edmond O´Brien). Tomado por alucinações, a ponto de não conseguir manter-se em eventos da classe sem beirar o histerismo, Anthony encontra em seu caminho a garçonete Pat Kroll (Shelley Winters), com quem inicia um relacionamento e que acaba servindo de válvula de escape do ator para seus delírios cada vez crescentes e violentos.

Todo em preto e branco, "Fatalidade" tem o charme dos film noirs daquela década, sem trazer seus elementos tradicionais, emprestando-lhe somente o espírito sombrio que casa bem com a loucura crescente de Anthony John, um ator que ultrapassa os limites da sanidade ao buscar a perfeição. Lembra um pouco a loucura de Norma Desmond ("Crepúsculo dos Deuses"), embora por razões diferentes: enquanto Norma não seguiu os rumos do novo cinema que sepultou de vez a era muda da sétima arte, entrando em declínio psicológico ao acreditar que o mundo do espetáculo ainda a idolatrava, Anthony se deixou levar pelo sucesso na carreira e busca na perfeição, misturando a ficção de Othelo com sua própria vida de amor platônico pela ex-esposa e quebrando o seu próprio equilíbrio. É no crime cometido e descoberto, no entanto, que Anthony John, definitivamente encarnando Othelo, chega ao ponto alto de sua intepretação. Em sua visão deturpada, incapaz de distinguir realidade e ficção, lhe resta somente esperar a punição autoinfligida.

quarta-feira, 14 de março de 2012

Anne Frank e as trevas da ignorância


No último dia 12, uma homenagem resgatou a data em que, em 1945, a adolescente Anne Frank, aos 15 anos, sucumbiu ao tifo e à inanição no campo de concentração de Bergen-Belsen, para onde havia sido mandada com sua irmã Margot, também vítima das condições insalubres do lugar, dias antes. A história da menina judia é bem conhecida de quem tem conhecimentos sobre literatura e cinema, pois o diário resgatado após o final da Segunda Guerra pelo pai de Anne e Margot, Otto (único sobrevivente da família Frank) foi levado a público e adaptado para o teatro, televisão e cinema.

A história de Anne Frank é apenas uma entre milhões de outras, sobre vidas ceifadas pela intolerância disseminada na Europa pelos nazistas em um dos episódios mais negros do século 20. Por seu caráter praticamente industrial, levado a extremos, o Holocausto (e aqui não incluo somente os judeus, mas também outras populações perseguidas e quase exterminadas em nome da "superioridade racial ariana", como os ciganos, os portadores de deficiência assassinados no programa de eutanásia, os homossexuais e outros) é o ápice da desgraça humana. Como uma pestilência, o antissemitismo e a intolerância com o diferente espalhou-se pela Europa nazista, mergulhando-a nas trevas. Escuridão essa que nunca dissipou totalmente.

Os crimes nazistas, ao mesmo tempo em que revoltaram o mundo, fizeram escola. Em várias partes do globo grupos de pessoas reverenciam a memória de Hitler, atacam seus semelhantes pelo simples prazer de fazer o mal sob a desculpa de uma falsa superioridade. Até mesmo no Brasil, em terras consideradas pacíficas, verdadeiros bandidos queimam, agridem, matam, mutilam, perseguem os que são diferentes. E mesmo entre os perseguidos, há os perpetradores de preconceitos contra seus semelhantes. 

Em seu diário, cuja versão em português tive a oportunidade de ler, assim como assistir à primeira versão cinematográfica de George Stevens, Anne narra os anos em que passou escondida com seus pais e sua irmã, e mais outra família judia, os Van Daan, em um sótão em Amsterdã, Holanda, durante a ocupação nazista. Enquanto vê o cerco se apertar sobre todos, registra seu cotidiano, suas descobertas de adolescente e as impressões sobre a guerra e a perseguição ao seu povo. Escondidos com a ajuda de amigos cristãos, isso não impediu que alguém entregasse o esconderijo e as famílias Frank e Van Daan tivessem o destino de outras milhões de famílias judias, enviadas às câmaras de gás ou trabalho escravo nos campos de concentração. Somente Otto Frank escapou da morte e conseguiu tornar o diário da filha um testemunho de vidas destruídas pela intolerância. 

Em vez de o mundo refletir com as palavras de Anne, preferiu seguir as trevas da ignorância. Tempos depois, nos Bálcãs, uma "limpeza étnica" resultou na morte de milhares. Em Ruanda, uma briga política resultou no genocídio de mais de 1 milhão de tutsis em menos de três meses, perpetrado pela maioria hutu. No Oriente Médio, palestinos, israelenses, curdos e todos os tipos de grupo humano matam e são mortos em nome de ideais egoístas e questionáveis. E esses são aqueles conflitos humanos de maior impacto. O que ocorre e não chega a nosso conhecimento, sim, ainda impede de se antever o quanto é grande a nossa monstruosidade.

domingo, 11 de março de 2012

Dois anos sem vícios!



Parei de fumar há quase dois anos, depois de ser fumante por 24 anos (e, nesse período, ter idas e vindas do vício). E por igual tempo larguei de vez o consumo de bebidas alcoolicas. Um puxava o outro. Mesmo consumindo bebidas mais "leves", como as destiladas, a vitória não estava completa. Agora, sim, a bebida foi a nocaute juntamente com a nicotina e seus malefícios. Ficaram pequenas sequelas, mas a que seria mais grave, o desenvolvimento de algum tipo de câncer, não apareceu, pelo menos por enquanto.

As piadinhas apareceram, como era de se esperar, e chegaram a beirar a irritação. Para alguns, eu havia virado crente - como se isso fosse um crime, diga-se de passagem. Fiquei mais chato - ou seja, o motivo de risos nas "barcas" morreu com o cigarro e o álcool. Evitar festas regadas a muita bebida e cigarros virou uma regra que segui à risca, mesmo parecendo estar afastando-me dos amigos, mas se trata somente de me preservar da tendência ao alcoolismo que reconheci possuir. Mas passou. Hoje levo uma vida com mais qualidade, sem esses dois vícios. Botei na cabeça que iria sair disso e consegui. Bastava imaginar o odor que a bebida e o cigarro deixavam e o incômodo que causavam nas outras pessoas para ajudar a resistir bravamente. E, por outro lado, um drama pessoal ajudou e muito: o fato de meu pai ter sofrido um derrame aos 85 anos e sofrido sobre uma cama durante seis meses, até que um segundo derrame o tirou de nossa convivência física. 

Sim, isso ajudou, porque meu pai não dispensava a bebida. Homem do sertão nordestino, como minha mãe, meus avós, tios e demais parentes da geração antecessora, sempre foi forte, mas a doença que o afligiu - o Mal de Alzheimmer - o fez perder a noção de tempo, espaço e vida. Assim, o consumo de bebidas acabou resultando nesse quadro. Vi ali uma espécie de alerta - é hora de parar. Solteiro, sem filhos, quem vai ter essa preocupação quando eu for vítima de meus vícios? 

Assim foi que, aos 38 anos, resolvi parar com o comportamento errante resultante na ressaca potencializada pelo consumo desenfreado de bebidas e cigarros. Decidi dar adeus aos dias sem comer e de somente aspirar fumaça, aos vômitos, às cólicas intestinais. Coloquei em minha mente a necessidade de acabar com esse processo de autodestruição e aproveitar a vida de outra maneira, afinal, não é preciso estar bêbado ou com odor forte de nicotina para mostrar uma pessoa feliz. É possível, sim, sair desse vício. Difícil para alguns, mas não impossível, afinal, como diz o manjado ditado, "só não há jeito para a morte". 

Boa vontade para mudar é um bom começo. Querer mudar é importante. Enfrentar as situações de outro modo, com mais serenidade, é uma ferramenta importante. E, acima de tudo, quem sabe o que pode ser melhor para você é somente você mesmo. Assim o fiz, assim o consegui.

Quem merece um pé no traseiro?

Finalmente o ano começou aqui no blog, após o hiato do pós reveillon e da folia carnavalesca. E não poderia começar melhor, com um membro da Fifa falando que nosso país merecia um "pé na bunda" por conta do andor da procissão das obras para a Copa do Mundo de 2014.

Como era de se esperar, muita gente "se doeu", como se costuma dizer popularmente. Sem querer entrar no mérito do caráter do autor da frase que melindrou meia nação (ou sua quase totalidade), sou obrigado a reconhecer: se não pelas obras para a Copa de 2014, merecemos, sim, um belo coup de pied aux fesses.

Antes que eu seja chamado de reacionário ou seja alvo de adjetivos mais eloquentemente depreciativos, cabe-me frisar: só se ofende quem não gosta da verdade. Francamente, quem acha que o país está realmente preparado para sediar a Copa a esta altura? Ainda temos dois anos, mas muita coisa caminha a passos lerdos, emperrados pela incompetência burocrática ou pelo velho jogo de "vamos ver onde nós podemos lucrar mais". Minto? E isso refere-se somente à Copa!

A julgar pelos absurdos que vemos todos os dias em nosso Brasil, se cada golpe nas partes traseiras baixas fosse uma tentativa de botar nosso país nos eixos, sem dúvida as nádegas tupiniquins não poderiam conseguir um encosto tão cedo. Temos paradoxos monstruosos em nossas leis. Honestidade ainda parece a muitos coisa do outro mundo. Vidas humanas ceifadas por irresponsáveis no trânsito custam uma mísera fiança. Falta pouco para criarem um imposto sobre o ar respirado. Enquanto trabalhadores sofrem para ter um reajuste decente nos salários, uma cambada se aproveita para aumentar seus vencimentos e criar cada vez mais mordomias (e enquanto uns poucos se revoltam contra isso, outros da mesma classe ficam impassíveis e não se mexem para acabar com essa baderna). O incremento cultural hoje se evidencia pela louvação a uma música de parcos versos a exaltarem a masturbação ou um programa de situações suspeitas que é defendido como expressão da cultura popular (a minha, mesmo, não!). Falsos homens da lei são punidos com aposentadoria e vencimentos integrais. Ladrões de galinha ficam presos tempos a fio enquanto meliantes de terno, gravata e toga surrupiam a nação sem uma demonstração de arrependimento. Gangues de marginais travestidos de torcedores de times de futebol promovem uma verdadeira guerra civil, e ainda assim se libera o uso de bebida alcoólica nos estádios durante os jogos da Copa.

A lista de aberrações em nosso Brasil lindo e imenso, de povo alegre e hospitaleiro, de belezas naturais fantásticas, é muito extensa. A quem não se conforma com essa onda de violência, corrupção, idiotice e estagnação que corre o país de norte a sul, só resta lamentar, porque os tempos de revolução ficaram no passado, como registros nos livros de história. O que mais importa à nova geração é balada, Big Brother, a pobreza da cultura de massa e o umbigo de cada um. Agora, deixando de lado o comportamento nervosinho do Jerome Valcker, merecemos ou não um pé na bunda?

VIAGEM: Cabaceiras, PB (06/04/2024)

Pela terceira vez viajei à Paraíba nas férias - e a primeira vez com meu marido Érico -, e essa foi a oportunidade de realizar um sonho, alé...