Skeeter, Minny e Aibileen: exposição de conflitos raciais |
Na década de 1960, os
movimentos pelos direitos humanos fervilhavam nos Estados Unidos. Na
pequena cidade de Jackson, no Mississipi, os negros usam banheiros
separados e são segregados no fundo dos ônibus, só conseguem
subempregos e são tratados como inferiores pela população branca.
Enquanto o fim das barreiras sociais entre as duas raças não chega,
a amarga Aibileen (Viola Davis) cuida da casa e da filha pequena – e
rejeitada – de Celia Foote (Jessica Chastain), criança a quem
direciona todos os cuidados e carinhos que poderia ter dado ao filho,
morto aos 24 anos em um acidente de trabalho.
Assim é o ponto de
partida de “Histórias cruzadas” (“The help”, EUA, 2011),
dirigido por Tate Taylor e que conseguiu grande destaque por
concorrer ao Oscar em três categorias (Melhor Filme, Melhor Atriz e
duas indicações para Melhor Atriz Coadjuvante) no ano seguinte.
Quando Skeeter (Emma
Stone) volta para a cidade, após concluir os estudos em outra localidade,
consegue um emprego como redatora de uma coluna sobre dicas
domésticas no jornal de Jackson e procura em Aibileen sua fonte de
informações. No entanto, a jovem aspirante a jornalista enxerga na
empregada de Celia uma chance de tentar algo novo e desafiador para o
racista Mississipi: mostrar a situação dos negros na cidade a
partir do ponto de vista dos próprios segregados. Assim, vencendo
aos poucos a resistência de Aibileen em contar sua própria vida,
Skeeter consegue, com o passar dos dias e com novos fatos ligados a
conflitos raciais, agregar em seu projeto a resoluta Minny (Octavia
Spencer, que levou o Oscar, o Globo de Ouro e outras premiações
pelo seu desempenho), que ao ser flagrada por sua patroa, Hilly
Halbrook (Bryce Dallas Howard), usando o banheiro dos patrões – o
que era uma afronta aos racistas -, é demitida e ainda por cima
difamada pela mulher, impedindo-a de obter outro emprego. Nessa
empreitada de Skeeter, Hilly será a maior antagonista do grupo, uma
hipócrita infeliz e rancorosa que apela a todo momento a uma suposta
“superioridade ariana” para inferiorizar os negros.
O mérito do filme é
revelar no microcosmo de Jackson todo o fervor de uma era de
segregação fadada ao fracasso. Os agitos que marcaram aquela época
– a ascensão de Martin Luther King, o assassinato do presidente
John Kennedy – são vistos como pano de fundo para a serenidade
conformista da pequena cidade do Mississipi. O livro que Skeeter
consegue publicar e as consequências dele – não tão favoráveis
a todos os envolvidos – é que significam o rompimento com a
mentalidade ainda escravagista daquela época. Aibileen aos poucos
desperta com o auxílio de Skeeter, estendendo essa conscientização
a Minny e, posteriormente, às outras mulheres negras que passam –
ou passaram – pela mesma humilhação imposta por causa de sua cor.
Emocionante sem ser
piegas e com ótimos lances de comédia por parte da personagem de
Octavia Spencer – principalmente o episódio da “torta da
vingança” -, “Histórias cruzadas” é um daqueles filmes que
deixa o gosto de “quero mais” após a última cena.
(Publicado no caderno Plateia, jornal Amazonas em Tempo, de 22/12/2013)