segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

Comentário: "Histórias cruzadas" (The help, 2011)

Skeeter, Minny e Aibileen: exposição de conflitos raciais
Na década de 1960, os movimentos pelos direitos humanos fervilhavam nos Estados Unidos. Na pequena cidade de Jackson, no Mississipi, os negros usam banheiros separados e são segregados no fundo dos ônibus, só conseguem subempregos e são tratados como inferiores pela população branca. Enquanto o fim das barreiras sociais entre as duas raças não chega, a amarga Aibileen (Viola Davis) cuida da casa e da filha pequena – e rejeitada – de Celia Foote (Jessica Chastain), criança a quem direciona todos os cuidados e carinhos que poderia ter dado ao filho, morto aos 24 anos em um acidente de trabalho.

Assim é o ponto de partida de “Histórias cruzadas” (“The help”, EUA, 2011), dirigido por Tate Taylor e que conseguiu grande destaque por concorrer ao Oscar em três categorias (Melhor Filme, Melhor Atriz e duas indicações para Melhor Atriz Coadjuvante) no ano seguinte.

Quando Skeeter (Emma Stone) volta para a cidade, após concluir os estudos em outra localidade, consegue um emprego como redatora de uma coluna sobre dicas domésticas no jornal de Jackson e procura em Aibileen sua fonte de informações. No entanto, a jovem aspirante a jornalista enxerga na empregada de Celia uma chance de tentar algo novo e desafiador para o racista Mississipi: mostrar a situação dos negros na cidade a partir do ponto de vista dos próprios segregados. Assim, vencendo aos poucos a resistência de Aibileen em contar sua própria vida, Skeeter consegue, com o passar dos dias e com novos fatos ligados a conflitos raciais, agregar em seu projeto a resoluta Minny (Octavia Spencer, que levou o Oscar, o Globo de Ouro e outras premiações pelo seu desempenho), que ao ser flagrada por sua patroa, Hilly Halbrook (Bryce Dallas Howard), usando o banheiro dos patrões – o que era uma afronta aos racistas -, é demitida e ainda por cima difamada pela mulher, impedindo-a de obter outro emprego. Nessa empreitada de Skeeter, Hilly será a maior antagonista do grupo, uma hipócrita infeliz e rancorosa que apela a todo momento a uma suposta “superioridade ariana” para inferiorizar os negros.

O mérito do filme é revelar no microcosmo de Jackson todo o fervor de uma era de segregação fadada ao fracasso. Os agitos que marcaram aquela época – a ascensão de Martin Luther King, o assassinato do presidente John Kennedy – são vistos como pano de fundo para a serenidade conformista da pequena cidade do Mississipi. O livro que Skeeter consegue publicar e as consequências dele – não tão favoráveis a todos os envolvidos – é que significam o rompimento com a mentalidade ainda escravagista daquela época. Aibileen aos poucos desperta com o auxílio de Skeeter, estendendo essa conscientização a Minny e, posteriormente, às outras mulheres negras que passam – ou passaram – pela mesma humilhação imposta por causa de sua cor.

Emocionante sem ser piegas e com ótimos lances de comédia por parte da personagem de Octavia Spencer – principalmente o episódio da “torta da vingança” -, “Histórias cruzadas” é um daqueles filmes que deixa o gosto de “quero mais” após a última cena. 

(Publicado no caderno Plateia, jornal Amazonas em Tempo, de 22/12/2013)

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